Prof. Dr. Ricardo Pereira Cabral
A 1ª Guerra Mundial, de 28 de julho de 1914 a 11 de novembro de 1918, foi o conflito mais sangrento da Humanidade até então, com nove milhões de combatentes e cinco milhões de civis mortos. Durante o conflito foram introduzidos, em grande escala, novos armamentos como os aviões, os blindados, os submarinos e os gases. A letalidade das armas empregadas era muito alta e os Estados-Maiores insistiram em estratégias ultrapassadas resultando em milhares de mortes em cada batalha. Somente no final do conflito, táticas inovadoras foram implementadas. Unidades de infantaria, apoiadas pela artilharia, blindados e o emprego dos aviões em apoio as ações no terrenos deram um vislumbra do que seria a próxima guerra. No mar, o emprego dos submarinos e o surgimento dos porta-aviões mudariam a forma da guerra no mar. Neste sentido, selecionamos algumas das batalhas mais importantes que ocorreram durante a Primeira Guerra Mundial chamando a atenção para alguns aspectos.
Campanha da Sérvia (28 de julho a 24 de novembro de 1915)
Em 28 de junho de 1914, o sérvio-bósnio Gavrilo Princip, assassinou o arquiduque Franz Ferdinand, herdeiro do trono do Império Autro-Húngaro. Este fato deu origem levou Viena enviar o Ultimato de Julho a Sérvia recebeu o Ultimato de Julho. O documento continha dez exigências, os sérvios concordavam com oito. Assim, a Áustria-Hungria declarou guerra à Sérvia em 28 de julho do mesmo ano. Devido ao sistema de alianças, Reino Unido, França, Rússia e Alemanha logo se juntaram aos combates e a frente de batalha se estendeu do Danúbio ao sul da Macedônia e ao norte. Os dois lados tiveram 745 mil mortos, feridos e desaparecidos. As mortes entre os civis são estimadas em 840 mil civis sérvios. Era o prenúncio da carnificina que viria.
Batalha de Tannenberg (26 a 30 de agosto de 1914)
A Batalha de Tannenberg foi travada entre o 1º Exército russo, comandado pelo general Paul von Rennernkampf e 2º Exército russo, sob o comando do general Alexander Samsomov contra o 8º Exército alemão, comandado pelo Marechal Paul von Hidenburg, que tinha como chefe do Estado-Maio, o general Erich Ludendorff, de 26 de agosto a 30 de agosto de 1914, durante o primeiro mês da Primeira Guerra Mundial. Depois do desastre russo de tentar invadir a Prússia Oriental, os russos se recuperaram e conseguiram derrotar os alemães em Gumbinnen (20/8/1914). O plano da Rússia era destruir o 8º Exército alemão cercando-o, com o 2º Exército estava atacando a sudeste e o 1º Exército ao norte. O 1º Exército, no entanto, parou e os alemães reagiram atacando o 2º Exército exposto. Os alemães foram hábeis em explorar as rivalidades e desavenças entre os dois comandantes russos e fizeram uma manobra brilhante. A batalha é particularmente notável pelos rápidos movimentos utilizando as linhas ferroviárias pelo 8º Exército Alemão, permitindo que eles se concentrem contra cada um dos dois exércitos russos, em um primeiro momento atrasando o 1º Exército russo e depois destruindo o 2º Exército antes de voltar a atacar o Primeiro dias depois. Também é notável o fracasso dos russos em codificar suas mensagens de rádio, transmitindo suas ordens diárias de marcha em claro, o que permitiu aos alemães fazer seus movimentos com a confiança de que não seriam flanqueados. Apesar de estar em desvantagem numérica, os alemães conseguiram infligir uma enorme derrota aos russos em Tannenberg. Um dado interessante, a batalha ocorreu realmente perto de Allenstein (Olsztyn), mas Hindenburg a nomeou em homenagem a Tannenberg, 30 km a oeste, a fim de vingar a derrota dos Cavaleiros Teutônicos na 1ª Batalha de Tannenberg, travada a 504 anos antes, mais precisamente em 15 de julho de 1410. As baixas alemães (mortos e feridos) foram em torno 30 mil homens, enquanto que os russos tiveram em torno de 90 mil e 92 mil foram feitos prisioneiros.
1ª Batalha do Marne (de 5 a 12 de setembro de 1914)
A 1º Batalha do Marne foi travada ao norte e a leste de Paris de 5 a 7 de setembro de 1914. A Bélgica já havia sido invadida pelos alemães, que estavam rapidamente avançando pela França e ameaçando Paris. As tentativas de deter o avanço do exército alemão já haviam custado às pesadas baixas britânicas e francesas. Parecia inevitável que Paris caísse. Diante dessa situação tática, o marechal de campo Sir John French, comandante da Força Expedicionária Britânica (BEF), começou a planejar uma retirada britânica completa para cidades portuárias no Canal da Mancha para uma evacuação imediata. O governador militar de Paris, Joseph Simon Gallieni, queria que as unidades franco-britânicas contra-atacassem os alemães ao longo do rio Marne e detivessem o avanço alemão. As reservas da Entente restaurariam as fileiras e atacariam os flancos alemães. Em 5 de setembro, começou a contra-ofensiva de seis exércitos franceses e da Força Expedicionária Britânica (BEF). Em 9 de setembro, o sucesso da contra-ofensiva franco-britânica dcolocou o 1º e 2º Exércitos alemães diante da possibilidade de serem cercados, obrigad0-os a recuar para o rio Aisne. Os exércitos alemães realizaram a chamada Retirada de Mons, no que foram perseguidos pelos franceses e britânicos. Os exércitos alemães recuaram 65 km e estabeleceram uma linha ao norte do rio Aisne, onde cavaram trincheiras e lutariam a 1ª Batalha do Aisne(13 a 28/9/1914). A retirada alemã de 9 a 13 de setembro marcou o fim da tentativa de derrotar a França esmagando os exércitos franceses com uma invasão do norte pela Bélgica e no sul pela fronteira comum. Ambos os lados iniciaram operações recíprocas para envolver o flanco norte de seu oponente, no que ficou conhecido como a Corrida para o Mar, que culminou na 1ª Batalha de Ypres (19/10 a 22/11 de 1914). Os alemães sofreram pesadas baixas, o que significa que eles tiveram que abandonar o Plano Schlieffen e recuar. Este evento veio a ser conhecido como o “Milagre no Marne”. Nesta batalha se deu o primeiro uso militar da aviação, cumprindo uma missão de reconhecimento, mas logo em seguida estariam realizando outras missões como caça e bombardeio. A Entente teve 264 mil baixas (entre mortos e feridos) e Império Alemã 256 mil baixas.
2ª Batalha de Ypres (22 de abril a 25 de maio de 1915)
A Segunda Batalha de Ypres foi travada entre a Força Expedicionária Britânica Reino Unido, Canadá e Índia), Bélgica, França e suas forças colonias argelinas e marroquinas contra o Exército Alemão pelo controle do terreno elevado, taticamente importante a leste e sul da cidade de Ypres, no oeste da Bélgica. A Primeira Batalha de Ypres havia sido travada no outono anterior. A Segunda Batalha de Ypres foi o primeiro uso em massa pela Alemanha de gás venenoso na Frente Ocidental. Em 22 de abril de 1915, as tropas alemães lançaram mais de 150 toneladas de gás clorídrico contra duas divisões francesas na frente de Ypres. Foi o primeiro grande ataque a gás e devastou as linhas aliadas. Durante a guerra foram utilizados basicamente três tipos de gases venenosos: o gás lacrimogêneo, o gás cloro e o gás mostarda. A princípio, o exército francês e alemão utilizaram o gás lacrimogêneo como arma no front. Ao longo da guerra, o gás lacrimogêneo cedeu lugar ao gás cloro (mais letal) na preferência dos exércitos alemão, francês e inglês. As forças da Entente tiveram em torno de 80 mil baixas e os alemães 35 mil.
Campanha de Gallipoli (25 de abril de 1915 a 9 de janeiro de 1916)
Em 1915, a guerra de trincheiras no oeste havia se estabelecidos e havia gerado um impasse. Os dois lados estavam perdendo homens em assaltos inúteis contra fortes posições defensivas. Além disso, a acachapante derrota russa em Tannenberg, limitou a capacidade russa de se envolver em operações ofensivas. Como resultado, a Entente perdeu uma aliado poderoso que dividia os esforços de guerra dos Impérios Centrais. O impasse na frente ocidental, levou a Entente a buscar abrir uma segunda frente. Winston Churchill, então primeiro lorde do Almirantado, decidiu atacar os Dardanelos (atual Turquia) a fim de ameaçar Istambul, a capital otomana. A derrota da Turquia, aumentaria a segurança do Canal de Suez e abriria uma rota de abastecimento aliada durante todo o ano através do Mar Negro para portos de água quente na Rússia. Os turcos tinham baterias de artilharia de costa em ambos os lados do Estreito de Dardanelos e minado dois trechos do Mar de Mármora. A conquista das elevações logo após a linha da praia era fundamental para o sucesso do assalto anfíbio, pois ofereciam excelentes posições defensivas e fogo direto sobre a praia. A tentativa da frota aliada de forçar a passagem pelos Dardanelos em fevereiro de 1915 fracassou e foi seguida por um desembarque anfíbio na península de Gallipoli em abril de 1915. A resistência turca diante das tropas britânicas, australianas e neozelandesas bloqueou o avanço aliado. Diante do impasse a força de invasão retirada. Galipoli foi uma grande vitória otomana. As baixas aliadas foram da ordem de 300 mil (mortos, feridos e desaparecidos), os otomanos tiveram 255 mil baixas.
Batalha de Verdun (de 21 de fevereiro a 18 de dezembro de 1916)
A Batalha de Verdun foi a mais longa batalha da Primeira Guerra Mundial (302 dias) e também a mais custosa em vidas humanas 377.231 baixas francesas e os alemães 337.000, um total de 714.231 e uma média de 70.000 por mês. Ela durou de 21 de fevereiro a 19 de dezembro de 1916 e ocorreu nas colinas ao norte de Verdun-sur-Meuse. Vamos resumir a batalha: o V Exército alemão atacou as defesas da região de Verdun e as posições do II Exército francês na margem direita (leste) do Meuse. Usando a experiência da 2ª Batalha de Champagne (26/9 a 6/11/1915), os alemães planejavam capturar as colinas de Meuse, uma excelente posição defensiva, com boa observação para orientar o fogo de artilharia em Verdun. A expectativa do Estado-Maior alemão era que os franceses comprometessem sua reserva estratégica para recapturar a posição e sofrer perdas catastróficas com pouco custo para os alemães, numa estratégia conhecida como batalha de desgaste. No entanto, o mau tempo atrasou o início do ataque até 21 de fevereiro, dando tempo para os franceses reforçarem suas posições. Após os fogos de preparação e lançado o ataque de infantaria, os alemães conseguiram capturar o Fort Douaumont. Apesar desse sucesso inicial, o ritmo do avanço do diminuiu por vários dias. Em 6 de março, cerca de 20 divisões francesas foram desdobradas em posições defensivas de grande profundidade em Verdum. O general Philippe Pétain ordenou que as tropas francesas não se retirassem e que os ataques alemães fossem contra-atacados. Em 29 de março, a artilharia francesa na margem oeste bombardiou constantemente as posições alemães na margem leste, causando muitas baixas. A ofensiva alemã foi estendida para a margem oeste do Mosa a fim de eliminar a artilharia francesa, mas os ataques não conseguiram atingir seus objetivos. No início de maio, os alemães mudaram de tática novamente e fizeram uma série de ataques e contra-ataques locais; os franceses recapturaram parte de Fort Douaumont, mas os alemães os expulsaram. Os alemães passaram então a alternar seus ataques em ambos os lados do Meuse e em junho capturaram Fort Vaux. Os alemães avançaram em direção aos últimos objetivos do plano original, em Fleury-devant-Douaumont e Fort Souville, um saliente para as defesas francesas. Fleury foi capturado pelos alemães que chegaram a 4 km da cidadela de Verdun, mas em julho a ofensiva teve que ser reduzida para fornecer tropas, artilharia e munição para a Batalha do Somme. Os franceses fizeram movimento semelhante transferindo o X Exército francês para a frente de Somme. De 23 de junho a 17 de agosto, o Forte Fleury mudou de mãos dezesseis vezes e um ataque alemão a Fort Souville falhou. A ofensiva foi reduzida ainda mais com a transferência de mais troipas para o Somme. Além disso o objetivo mudou, nesta altura da batalha, passou a ser a fixação do máximo de tropas francesas na região de Verdum, impedindo que fossem reforçar a frente do Somme. De setembro a dezembro, as contra-ofensivas francesas recuperaram muito terreno na margem leste, o Fort Douaumont e o Fort Vaux. Na França, a Batalha de Verdun passou a simbolizar a determinação do exército francês e a destrutividade da guerra.
Na próxima semana continuaremos com a segunda parte sobre As Batalhas mais importantes da Primeira Guerra Mundial
Imagem de Destaque: Circa 1917: Allied soldiers in the British sector climb out of a trench during World War I, Ypres, Belgium. Source: Hulton Archive/Archive Photos
https://www.bloomberg.com/opinion/articles/2022-07-24/who-exactly-started-ww1-lessons-for-the-us-china-rivalry
Fontes consultadas
Professor de História formado pela UGF. Mestrado e Doutorado em História pela UFRJ. Autor de artigos sobre História Militar e Geopolítica.