A Batalha de Diu

de

Prof. Dr. Ricardo Pereira Cabral

Em 3 de fevereiro de 1509, foi travada a Batalha de Diu, no Mar da Arábia, no porto de Diu, na Índia, entre uma esquadra comandada por D. Francisco de Almeida, do Reino de Portugal contra uma frota conjunta do Sultão de Gujarat, do Sultanato Mameluco Burji do Egito e do Samorin de Calicute com o apoio da República de Veneza.

A esquadra portuguesa era composta por 5 grandes naus, 4 naus pequenas, 4 caravelas redondas, 2 caravelas latinas, 2 galés e 1 bergantin.

A esquadra muçulmana era composta por 6 carracas mediterrâneas, 4 carracas de Diu, 30 fustas de Diu e de 70 a 150 fustas de guerra de Calicute.

Antecedentes e contexto político-estratégico

Por volta de 1500, apesar de terem chegado à Índia por mar e vislumbrado grandes perspectivas comerciais, os portugueses passaram a enfrentar a oposição das elites mercantis muçulmanas na costa ocidental indiana.

Os muçulmanos atacavam feitorias, navios e agentes portugueses, destruíram instalações comerciais em Calicute, além de sabotarem os esforços diplomáticos lusos na Índia. Portugal se aliou a Cochin na sua luta contra Calicute.

Os portugueses conseguiram devastar as terras e prejudicar o comércio de Calicute, então o principal exportador de especiarias de volta para a Europa, através do Mar Vermelho. Em dezembro de 1504, os portugueses destruíram a frota mercante anual do samorim, com destino ao Egito e carregada de especiarias.

Em 1505, D. Manoel I, enviou uma esquadra comandada por Dom Francisco de Almeida para defender os entrepostos comerciais e as linhas de comunicação portuguesas no Oceano Índico.

Os comerciantes muçulmanos não tinham como resistir aos portugueses e pediram ajuda aos venezianos (rivais dos portugueses no comércio de especiarias) e ao sultanato mameluco do Egito. Era pelo Egito por onde passavam as principais as rotas terrestres que carregavam as especiarias para o Mediterrâneo.

Os mamelucos tinham pouca experiência em guerra naval e pediram apoio a Veneza, em troca da redução de tarifas para facilitar a competição com os portugueses. Veneza forneceu aos mamelucos naus do tipo mediterrâneo e galeras de guerra tripuladas por marinheiros gregos, que os construtores navais venezianos ajudaram a desmontar em Alexandria e remontar no Suez. As galeras podiam instalar canhões na proa e na popa, mas não ao longo das amuradas, pois os canhões interfeririam nos remadores. Os navios nativos, com suas pranchas de madeira costuradas, podiam carregar apenas canhões muito leves. Esses navios não seriam páreo para as naus e caravelas portuguesas.

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A expedição muçulmana foi confiada a emir Hussain Al-Kurdi. A força naval foi reforçada com mercenários de várias regiões muçulmanas e artilheiros venezianos.

Em março de 1508, a esquadra de Al-Kurdi chegou a Diu. A cidade era governada por Malik Ayyaz, que havia transformado a cidade no principal porto de Gujarat e um dos principais entrepostos entre a Índia e o Golfo Pérsico. Ayyaz mantinha relações amistosas com os portugueses focando o comécio e uma política de neutralidade. A chegada de Al-Kurdi obrigou Ayyaz a se posicionar ao lado da esquadra muçulmana, devido a questões políticas.

Em março de 1508, as frotas de Hussain e Ayyaz navegaram para o sul e enfrentaram navios portugueses em um combate naval no porto de Chaul. O comandante português era o capitão-mor dos mares da Índia, Lourenço de Almeida, encarregado de supervisionar o carregamento dos navios mercantes aliados naquela cidade e escoltá-los de volta a Cochim.

Os muçulmanos conseguiram afundar a nau capitânea portuguesa, mas o restante da esquadra conseguiu escapar. Lourenço de Almeida, era filho de Dom Francisco de Almeida, e morreu em combate.

Tão logo soube da derrota portuguesa em Chaul  e da morte de seu filho, D. Francisco de Almeida tomou providências para combater a esquadra muçulmana. No entanto, a monção se aproximava e com ela as tempestades que inibiam a navegação no Índico até setembro. Só após a monção, o vice-rei poderia chamar de volta todos os navios portugueses disponíveis para reparos em doca seca e reunir suas forças em Cochim.

No dia 9 de dezembro, a frota portuguesa partiu, fazendo paradas em Calicute, Angediva, Dabul, Chaul e Bombaim antes de chegar a Diu.

A batalha

https://pt.m.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Battle_of_Diu_1509_Diagram.png

Em 2 de fevereiro de 1509, os portugueses avistaram Diu do alto das gáveas. Conforme eles se aproximavam, Malik Ayyaz retirou-se da cidade, deixando o comando geral para Hussain. Ele ordenou que as fustas saíssem e assediassem a frota portuguesa antes que eles tivessem tempo de se reorganizarem, mas eles não passaram além do alcance dos canhões da fortaleza. Ao cair da noite, a esquadra muçulmana recuou para o canal, Dom Francisco de Almeida convocou seus capitães em um conselho para decidirem sobre a manobra a ser feita. Ao raiar do dia, os portugueses viram que os muçulmanos tinham decidido aproveitar que o porto de Diu protegido pelo seu forte, trancando as naus e galés junto à costa e aguardando o ataque português, desistindo assim da iniciativa.

As forças portuguesas se dividiram em quatro grupos: um grupo para abordar as naus muçulmanas após um bombardeio preliminar, outro para atacar pelo flanco as galés inimigas estacionadas, um ‘grupo de bombardeio’ que apoiaria o restante da frota, e a própria nau capitânia, que não participaria da abordagem dos navios mamelucos, mas se posicionaria de modo a comandar a batalha e apoiá-la com seu poder de fogo. O bergantim Santo António asseguraria as comunicações.

A pequena nau Santo António percorreu a esquadra divulgando o discurso do vice-rei, no qual detalhou as razões pelas quais lutavam e quais as recompensas que seriam recebidas em caso de vitória: direito ao saque, os soldados seriam armados cavaleiros, aos cavaleiros seriam concedidos títulos de nobreza, as degredados perdão e escravos seriam elevados a condição de escudeiros se fossem libertados no prazo de um ano.

O vento mudou e, por volta das 11 horas, a bandeira real foi hasteada no topo da nau capitânea Flor do Mar e um único tiro foi disparado, sinalizando o início da batalha. Ao brado de Santiago!!! os portugueses iniciaram a aproximação, com a galera São Miguel à frente da formação, sondando o canal. Um bombardeio geral entre as duas forças precedeu a luta e, nas águas calmas do porto de Diu, os portugueses empregaram uma tática de artilharia inovadora: ao dispararem um tiro rasante, as balas de canhão ricocheteavam sobre a superfície da água como pedras. Uma bordada da nau Espírito Santo atingiu um dos navios inimigos na linha d’água, afundando-o instantaneamente.

Com o contato das naus, a capitânia de Hussain foi abordada pela Espírito Santo. Quando os castelos de proa se cruzaram, um grupo portugueses saltou para o castelo de proa inimigo e, antes que os navios estivessem seguros, os portugueses já haviam invadido o meio do navio. Antes que a nau capitânia fosse capturada, porém, outra nau muçulmana veio em seu auxílio, abordando o Santo Espírito pelo lado oposto. Hussain havia reforçado suas tropas com um grande número de soldados Gujarati, distribuídos pelos navios, e a infantaria portuguesa fortemente blindada de repente arriscou ser subjugada. A nau Rei Grande bateu contra o costado livre da nau capitânia de Hussain, entregando reforços extremamente necessários, o que fez pender a balança a favor dos portugueses.

Nas gáveas, arqueiros etíopes e turcos provaram seu valor contra tripulações de arcabuzeiros portuguesas. Muitos dos outros mercenários muçulmanos “fugiram à primeira vista dos portugueses”.

Hussain esperava que os portugueses comprometessem todas as suas forças na luta, então ele manteve os navios de remo leves dentro do canal, para atacar os portugueses por trás quando eles enfrentassem as naus. Compreendendo o estratagema, o capitão João da Nova manobrou a nau Flor do Mar para bloquear a entrada do canal e impedir que as fustas saíssem. A massa compacta de navios a remo constituiu um alvo ideal para os artilheiros portugueses, que inutilizaram muitos navios que bloquearam o caminho dos seguintes. Incapazes de romper, as fustas deram meia-volta após uma breve escaramuça e recuaram para Calicute. Ao longo da batalha, a Flor do Mar disparou mais de 600 tiros.

Enquanto isso, o grupo mais rápido de galés e caravelas atacou o flanco das galés inimigas estacionadas, cujos canhões não conseguiram responder. Um ataque português inicial foi repelido, mas uma bordada portuguesa deixou três das galés à deriva. Lenta mas seguramente, os portugueses protegeram a maioria das naus, ainda que com a visão turva devido a fumaça dos canhões. A nau capitânia de Hussain foi dominada e muitos tripulantes começaram a pular do navio. As galeras foram derrotadas e as caravelas rasas se posicionaram entre os navios e a costa, abatendo qualquer um que tentasse nadar até a praia.

Eventualmente, apenas um único navio permaneceu, uma grande nau, maior do que qualquer outra embarcação na batalha, ancorada muito perto da costa para a maioria dos navios portugueses de alto calado. O seu casco reforçado era impermeável aos tiros dos canhões portugueses e foi necessário um bombardeio contínuo de toda a frota para finalmente afundá-lo ao entardecer, marcando assim o fim da Batalha de Diu.

https://www.historiacombatemedieval.com.br/post/a-batalha-de-diu

Consequências

A vitória portuguesa foi crítica: a grande aliança muçulmana foi derrotada, facilitando a estratégia portuguesa de controlar o Oceano Índico para rotear o comércio pelo Cabo da Boa Esperança, contornando o histórico comércio de especiarias controlado pelos árabes e venezianos através do Mar Vermelho e Golfo Pérsico. Após a batalha, o Reino de Portugal capturou rapidamente vários portos importantes no Oceano Índico, incluindo Goa, Ceilão, Malaca, Bombaim e Ormuz. As perdas territoriais paralisaram o Sultanato Mameluco e o Sultanato Gujarat. A batalha catapultou o crescimento do Império Português e estabeleceu seu domínio político por mais de um século. O poder português no Oriente começaria a declinar com os saques de Goa e Bombay-Bassein, a Guerra da Restauração Portuguesa e a colonização holandesa do Ceilão.

A Batalha de Diu foi uma batalha de aniquilação semelhante à Batalha de Lepanto e à Batalha de Trafalgar, e uma das mais importantes da história naval mundial, pois marca o início do domínio europeu sobre os mares asiáticos que duraria até a Segunda Guerra Mundial.

Imagem de Destaque: https://alchetron.com/Battle-of-Diu-(1509)

Fonte

https://pt.wikipedia.org/wiki/Batalha_de_Diu

https://www.historiacombatemedieval.com.br/post/a-batalha-de-diu

WEIR, William. 50 Battles That Changed the World: The Conflicts That Most Influenced the Course of History. New Jersey: The Career Press, 2001.

Professor de História formado pela UGF. Mestrado e Doutorado em História pela UFRJ. Autor de artigos sobre História Militar e Geopolítica.

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