Divisão Azul: a participação dos estrangeiros nas Forças Armadas Alemãs

de

Prof. Esp. Pedro Silva Drummond

Introdução

No ano de 1939 iniciou-se a Segunda Guerra Mundial no Continente Europeu (o conflito na Ásia teve outras datas), com a chegada da Alemanha no território polonês. A invasão alemã na Polônia faz parte de um processo que teve início nos meados da década de 1930, com a anexação da Etiópia, 1935-1936, e da Albânia em 1939, o conflito do Japão desde 1937 com a China, na Segunda Guerra Sino-Japonesa, que durou de 1937 até 1945, e as conquistas territoriais da Alemanha na Áustria e a Checoslováquia e a participação na Guerra Civil Espanhola.

Durante a Guerra Civil Espanhola a Alemanha apoiou as tropas de Franco com o envio de grandes quantidades de armas, munições, tanques e veículos blindados, além do bombardeio na Cidade de Guernica. O apoio alemão à Espanha e as relações próximas entre os governantes, Hitler e Franco, demonstrava que o início da Segunda Guerra Mundial faria com que a Espanha pudesse entrar no conflito ao lado da Alemanha, isso não ocorreu, a Espanha se manteve neutra em relação o envio de tropas para a guerra, porém, isso não impossibilitou que espanhóis fizessem parte do conflito, integrando a chamada Divisão Azul.

A Divisão Azul foi uma divisão de infantaria composta por integrantes de diversas nações espalhadas pelo mundo, mas, sobretudo de espanhóis, que desejavam lutar e derrotar a URSS e o comunismo. Muitos espanhóis, principalmente franquistas, enxergavam nos soviéticos seus grandes adversários, especialmente depois da URSS ter contribuído na Guerra Civil Espanhola contra as tropas que apoiavam Franco.

Despedida de voluntários da Divisão Azul na estação del Norte em Madrid em 1941 – Martín Santos Yubero/ Archivo Regional de la Comunidad de Madrid
https://www.oarquivo.com.br/temas-polemicos/historia/4163-a-divis%C3%A3o-azul,-os-espanh%C3%B3is-e-portugueses-do-ex%C3%A9rcito-alem%C3%A3o.html

Durante a Operação Barbarossa, invasão da Alemanha ao território da URSS, os espanhóis criaram uma unidade voluntária para combater do lado dos alemães, a chamada Divisão Azul, e no momento que integrou as Forças Armadas Alemãs, era oficialmente designada a Divisão de Infantaria da Wehrmacht 250.

Criação e Participação da Divisão Azul

Com o início da Operação Barbarossa, o Ministro dos Negócios Estrangeiros da Espanha, Serrano Suñer, tinha como objetivo enviar um contingente voluntário para combater o comunismo, ao mesmo tempo, “Franco estava agradecido a Hitler por seu apoio durante a Guerra Civil… e enviaria a Rússia voluntários falangistas em reconhecimento a ajuda recebida pela Alemanha durante a Guerra Civil” (Juliá, 2012, p.66-72).

Com a decisão de Franco e a aceitação alemã da tropa, teve início os preparativos para a formação da Divisão, como explica Andreia dos Santos Diogo: “A unidade a enviar deveria ter caráter militar, pelo que, ao fim de algumas discussões, é acordado que os soldados seriam recrutados pela Falange, assim como um terço dos suboficiais, enquanto o exército contribuía com os oficiais e os especialistas. Uma nova discussão surgiria, desta vez, para eleger o comandante da unidade… O consenso chegaria com a nomeação do falangista Agustín Muñoz Grandes, militar distinguido e com 45 anos na altura. A 12 de dezembro de 1942 acabaria por ser substituído pelo general Esteban-Infantes… Por conseguinte, foram criados quatro regimentos de infantaria, sob o comando dos Coronéis Rodrigo, Esparza, Pimentel e Vierna. Verificou-se a criação de batalhões em Madrid, Saragoça, Sevilha, Ceuta, Valladolid, Corunha, Burgos, Valência e Barcelona. Criou-se ainda um regimento de artilharia, sob o comando do Coronel Badillo, unidades de reconhecimento, de sapadores, de antitanques, de sinais e de serviços médicos.” (Diogo, p.452).

Estandarte da Divisão Azul
https://pt.wikipedia.org/wiki/Divis%C3%A3o_Azul#/media/
Ficheiro:Spanische_Legion_3_Bat.jpg

Em Julho de 1941, a Divisão Azul já tinha se constituído e estava pronta para sair da Espanha e viajar para Alemanha, onde passaria por um período de treinamento. Na Alemanha a Divisão se integrou a Wehrmacht, como relata Andreia dos Santos Diogo: “No dia 25, a Divisão Azul era oficialmente designada de Divisão de Infantaria da Wehrmacht 250. O número de regimentos de infantaria foi reduzido de quatro para três, pelo que o Coronel Rodrigo foi apontado como subcomandante e o Coronel Pimentel, Vierna e Esparza ficaram, respetivamente, a comandar o 262º, 263º e 269º Regimento de Infantaria. Existia ainda o Batalhão de Reserva 250, o Grupo de Reconhecimento, o Grupo de Sapadores e outras equipas de suporte, como sinais, transporte, serviços médicos, polícia e companhia veterinária.” (Diogo, p.457).

A Divisão Azul foi composta por “voluntários reunidos em número muito superior ao requerido e finalmente foram selecionados 641 oficiais, 2.272 suboficiais e 15.780 soldados, para nutrir a divisão e 28 oficiais e suboficiais – dos quais 17 pilotos – e 81 cabos e soldados para a esquadrilha. No total 18.801 homens.” (SALAS, 1989, p. 252)

A pesquisadora Andreia dos Santos Diogo ainda descreve a viagem da Alemanha até o campo de batalha: “Após um curto mês de treino, a 20 de agosto de 1941, os voluntários começaram a marcha até à Rússia, onde seriam necessários 53 dias de viagem (9 dias de comboio, 31 a pé e outros 13 de comboio). Inicialmente, o destino original da Divisão era o Grupo de Exércitos Centro, mas a 18 de setembro dá-se uma alteração no destino, passando a ser o Grupo de Exércitos Norte. De comboio, os voluntários percorreram uma distância de 1.220 km, de Grafenwöhr até Suwalki na Polónia, onde chegaram no dia 26. De Suwalki, a 29 de agosto, a Divisão iniciou a sua marcha a pé, atravessando a Polónia e a Lituânia até chegar a Vitebsk, numa distância de aproximadamente 1.000 km. A 4 de outubro, várias colunas motorizadas da Divisão Azul partem de Vitebsk em direção a Novgorod. Entre os milhares de espanhóis encontravam-se meia centena de portugueses. A chegada dos primeiros contingentes à frente de combate, propriamente dita, deu-se a 12 de outubro, onde a Divisão Azul ficaria responsável pela salvaguarda de um território com uma extensão de 50 km, a fim de participar na “Operação Tikvin”. (Diogo, p.458).

Durante o final de 1941 e o início de 1942, a Divisão Azul enfrentou dois ataques soviéticos na região do rio Voljov, um ao norte sob o comando do general Pavel Kurotchkin, e ao sul comandada pelo general Kirill Meretskov. Nos dois locais a Divisão Azul acabou sem sucesso nos confrontos contra os soviéticos.

Soldados da Divisão Azul no posto de Prokrowskaja, URSS
https://pt.wikipedia.org/wiki/Divis%C3%A3o_Azul#/media/
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(aproximadamente_1941-1943).jpg

Em abril de 1942, a Divisão Azul conseguiu um grande sucesso aprisionando milhares de soldados do General Andrei Vlasov. Em agosto do mesmo ano, a Divisão Azul foi enviada a uma nova frente de batalha, na região de Leningrado, porém a situação da Divisão Azul se complicou, como explica Xavier Moreno Juliá; “ali ficaria sob a ação da artilharia russa, de uma grande potência, e uma vez encerrado o projetado ataque (16 de outubro), a luta se converteria em uma batalha de posições”. (Juliá, 2012, p.78)

Com as sucessivas vitórias soviéticas sobre os alemães, os rumos da guerra mudavam, em relação à Divisão Azul também ocorriam mudanças, no final do ano de 1942, Muñoz Grandes seria substituído pelo general Emilio Esteban-Infantes. No começo de 1943, mas exatamente em 19 de fevereiro, a Divisão Azul passou por uma das suas maiores perdas, a tragédia de Krasnyj Bor, com a morte de 1.125 de seus homens em um só dia. Com os eventos que ocorreram nesse mesmo ano, como a prisão de Mussolini e a derrota alemã em Kursk, motivaram a decisão do governo espanhol de acabar com a Divisão Azul e trazer de volta seus soldados para casa.

A Divisão Azul começou a sua retirada em outubro de 1943, dois anos após a sua entrada na guerra, como relata Andreia dos Santos Diogo: “No dia 24 de setembro de 1943, devido a pressões norte-americanas, Franco decide retirar a Divisão Azul da frente. Assim, a 5 de outubro, o Coronel General Lindemann informa o General Esteban-Infantes de que a Divisão azul deveria ser transportada para a zona de Volosovo-Nikolajeska. Seria nesta zona que, a 14 de outubro, o comandante da Divisão receberia a ordem de repatriação.” (Diogo, p.464).

Conclusão

A Divisão Azul foi uma divisão do exército que teve a participação de pessoas de diversas nacionalidades, porém, a maioria dos seus integrantes era composta por espanhóis, que entendiam que deveriam participar das Forças Armadas da Alemanha, pela boa relação que tiveram na Guerra Civil Espanhola e segundo, para combater a URSS e o socialismo, que estiveram do lado oposto das forças franquistas no conflito na Espanha antes da Segunda Guerra Mundial.

No caso de Portugal, país vizinho da Espanha, alguns portugueses que também entendiam que a URSS e o socialismo deveriam acabar, participaram da Divisão, mesmo os portugueses, sendo uma Nação neutra no conflito, e essa visão foi também um dos motivos que levaram integrantes de outros Países a integrarem a Divisão Azul.

Na Segunda Guerra Mundial, a Divisão Azul participou dos conflitos ocorridos na URSS, entre os anos de 1941 até 1943, quando foi retirada dos campos de batalha. A boa relação entre os militares espanhóis e alemães possibilitaram que mesmo com a saída da Divisão Azul do conflito, ocorresse à criação da Legião Espanhola Voluntários, que acabou se tornando uma substituta da Divisão Azul.

No primeiro semestre de 1944, chegaram à Espanha os últimos integrantes da Divisão Azul, só permanecendo no local, os integrantes da Legião Espanhola, como relata Xavier Moreno Juliá; “Ficaram então ao lado da Alemanha umas centenas de combatentes, mas já não como representantes da Espanha, …, mas como membros do Exército alemão. Nele lutaram, nas Waffen SS”. Os soldados da Legião, diferentemente da Divisão Azul, não lutaram somente na URSS, mas acabaram participando de conflitos, em diversas regiões da Europa.

A participação da Divisão Azul, e posteriormente da Legião Espanhola na Segunda Guerra Mundial, provocou além de mortos e feridos em combates de pessoas de diversas nacionalidades, no qual, seus países de origem eram neutros, mas também, a prisão desses integrantes em Gulags na URSS.

Imagem de Destaque: Voluntários falangistas, 1941 – https://www.oarquivo.com.br/temas-polemicos/historia/4163-a-divis%C3%A3o-azul,-os-espanh%C3%B3is-e-portugueses-do-ex%C3%A9rcito-alem%C3%A3o.html

Bibliografia

Diogo, Andreia dos Santos.  Os Voluntários Portugueses na Divisão Azul (1941-1943). Disponível em: <https://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/15251.pdf>. Acessado em: 18/09/2022.

Juliá, Xavier Moreno. La División Azul en el contexto de las relaciones entre la España de Franco y la Alemania nazi. Cuadernos de Historia Contemporánea. 2012, vol. 34. Disponível em: <https://revistas.ucm.es/index.php/CHCO/article/view/40064/38492>. Acessado em: 18/09/2022.

Salas, Ramón. La División Azul. Espacio, Tiempo y Forma. Historia Contemporánea, série V, n° 2, 1989. Disponível em: <http://e-spacio.uned.es/fez/eserv.php?pid=bibliuned:ETFSerie5-F4975798-2228-FB2C-6FD0-9CEBBD565976&dsID=Documento.pdf>. Acessado em: 18/09/2022.

Especialização em História Militar pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL), Graduação em História (Bacharel e Licenciatura) pela Universidade Gama Filho (UGF), autor de Artigos em História Militar.

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