Análise de Luis Simón e Lotje Boswinkel
A possível volta de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos traz novas dinâmicas ao conflito entre Rússia e Ucrânia. Durante a campanha, o ex-presidente prometeu encerrar a guerra antes mesmo de ser empossado, mas se recusou a detalhar suas estratégias, alegando que revelar seus planos enfraqueceria sua posição nas negociações. A possibilidade de um acordo de paz impulsionado por Trump levanta preocupações significativas, especialmente entre os aliados europeus.
Preocupações e interesses estratégicos
Uma das maiores inquietações é que Trump priorize a retirada dos Estados Unidos do conflito em troca de concessões territoriais por parte da Ucrânia, como a cessão da Crimeia e parte do Donbass. Além disso, propostas como limitar a expansão da OTAN e criar uma zona desmilitarizada no leste ucraniano têm sido mencionadas por aliados de Trump, o que representa uma ruptura com a política atual de Washington e com o compromisso europeu de apoiar Kiev até o fim da guerra.
Especialistas apontam que Trump, ao focar na contenção da China, pode considerar uma Rússia fortalecida como um contrapeso estratégico. Isso poderia levar a um entendimento mais amplo com Moscou, mesmo que à custa da soberania da Ucrânia. “A paz de Trump parece priorizar a retirada dos americanos de guerras prolongadas, mesmo que isso implique sacrificar a integridade territorial da Ucrânia”, avaliam analistas.
Europa diante de um cenário desafiador
Para a Europa, a perspectiva de um acordo desse tipo é alarmante. Sem o apoio financeiro e militar dos Estados Unidos, a infraestrutura de defesa europeia teria dificuldades em sustentar a Ucrânia. Apesar disso, líderes europeus entendem que tentar impedir um acordo de paz liderado por Trump pode ser inviável. Em vez disso, buscam maneiras de influenciar os termos desse acordo.
A melhor aposta da Europa seria garantir que a Ucrânia obtenha ganhos estratégicos em troca de quaisquer concessões. Isso inclui acelerar sua adesão à OTAN e à União Europeia, além de estabelecer mecanismos de segurança robustos, como a presença de forças multinacionais para dissuadir futuras agressões russas. No entanto, essas propostas enfrentam resistências, tanto de Moscou quanto de Trump, que sempre criticou a dependência europeia dos EUA para sua segurança.
Modelos e propostas em debate
Alguns analistas sugerem que a Europa deve buscar inspiração em acordos históricos, como o status da Alemanha após a Segunda Guerra Mundial, onde as potências ocidentais aceitaram o controle soviético sobre a Alemanha Oriental, mas garantiram a integração da Alemanha Ocidental ao Ocidente. Para a Ucrânia, um cenário semelhante poderia envolver a aceitação de perdas territoriais de fato, em troca da adesão à OTAN e à UE.
Entretanto, há preocupações de que um acordo mal elaborado, com concessões excessivas à Rússia e poucos mecanismos de execução, possa permitir que Moscou recarregue suas forças e volte a atacar a Ucrânia no futuro. Por outro lado, cenários mais positivos incluem limitar as perdas territoriais ao Donbass, desmilitarizar a Crimeia e fortalecer o resto da Ucrânia com garantias de segurança da OTAN.
Desafios para moldar a paz
Influenciar um possível acordo será uma tarefa complexa para a Europa. A falta de liderança política coesa, limitações financeiras e industriais e a dependência de Washington são obstáculos significativos. Ainda assim, a União Europeia e seus aliados podem usar incentivos econômicos e militares para garantir que qualquer acordo preserve a independência ucraniana.
Medidas como aumentar os gastos com defesa acima de 2% do PIB, modernizar as forças armadas ucranianas com tecnologia da OTAN e alinhar políticas econômicas com as prioridades dos EUA poderiam ajudar a Europa a se posicionar como uma força influente nas negociações. Além disso, financiar a reconstrução da Ucrânia e integrar rapidamente o país às estruturas políticas e econômicas do Ocidente seriam passos fundamentais para garantir a sustentabilidade de qualquer acordo.
Conclusão
A eleição de Trump pode redefinir o curso da guerra na Ucrânia, com implicações profundas para a Europa e o equilíbrio de poder global. Enquanto tenta se preparar para essa possibilidade, a Europa enfrenta o desafio de proteger seus interesses estratégicos e garantir a soberania da Ucrânia, mesmo diante de concessões inevitáveis. A chave será usar todas as ferramentas disponíveis para influenciar os termos do acordo, garantindo uma paz que não apenas encerre o conflito, mas também preserve a estabilidade na região a longo prazo.
*Este artigo traz uma análise sobre o texto original: Ukraine, Europe, and the Art of the Deal – War on the Rocks