Sérgio Vieira Reale
Capitão-de-Fragata (RM1
Todos podem ver as táticas empregadas nas minhas conquistas, mas o que ninguém pode visualizar é a estratégia que as possibilita”
Sun Tzu
“Aquele que comanda o mar, comanda o comércio; aquele que comanda o comércio do mundo, comanda as riquezas do mundo e, conseqüentemente, o próprio mundo”.
Sir Walter Ralegh (1552-1618)
Estratégia é uma palavra de origem grega que começou a circular na Europa, no século XVIII, e que pressupõe a existência de interesses conflitantes. Derivada de “stratégos” (arte do general), junção da palavra “stratos”, que designa essencialmente Exército ou grupo organizado, com a palavra “agein”, que significa conduzir, referia-se a formulação dos planos a serem executados pelos exércitos para atingir os objetivos fixados para a guerra. A Estratégia nasceu como uma entidade restrita aos campos de batalha terrestre. Arte ou ciência pela qual, com o emprego de seus meios de força, o Estado busca obter ou manter os objetivos fixados pela política, bem como orientar o emprego daqueles meios durante os conflitos armados.Além disso, a Estratégia surgiu como uma necessidade dos comandantes militares para avaliar fins e meios em relação ao que pretendiam conquistar ou proteger.
Com o passar do tempo, o conceito foi perdendo sua acepção original e sua denotação puramente bélica. Dessa forma, passou a ser definido como um conjunto de medidas pelas quais se busca, a partir de um estágio inicial, alcançar um estágio final desejado, numa situação em que se observa confronto de vontades, levando em consideração os fatores favoráveis e adversos que possam ser encontrados.
Na Antiguidade, a guerra no mar ainda era um prolongamento das batalhas terrestres e o combatente adversário era o principal objetivo da guerra naval.Não podemos colher muitos ensinamentos nos períodos em que a estratégia ainda estava nos seus primórdios. Entretanto, as esquadras eram basicamente empregadas nas batalhas decisivas ou para apoiar com suas fontes de suprimentos os exércitos que se deslocavam por terra. Até então, não havia a formulação de estratégias navais.
Um bom exemplo foi a invenção do corvo, mecanismo inventado pelos romanos, para favorecer a abordagem nos navios inimigos.
Este mecanismo consistia numa prancha de madeira articulada ao mastro, instalada na proa da embarcação, possuindo um gancho em forma de bico. A uma distância aproximada do navio inimigo a extremidade da prancha era liberada do mastro e caia sobre a embarcação adversária, perfurando seu convés e fazendo-a perder sua mobilidade. Logo, permitia que os romanos atravessassem pela prancha para o convés do navio inimigo para a luta corpo a corpona qual eram conhecidamente habilidosos.
Esse mecanismo foi empregado pela primeira vez em 260 a.C na vitória romana na Batalha de Mylae, no Nordeste da Sicília, contra os cartagineses.
A importância do uso do mar como fonte natural de recursos emeio de circulação de riquezas despertou desde cedo interesses antagônicos sobre a sua utilização. Somente quando a guerra naval passou a ter o propósito de obter o controle do mar, a fim de utilizá-lo em próprio benefício e negar seu uso ao inimigo começaram a ser estabelecidas as seguintesestratégias navais: a batalha decisiva para destruir a esquadra inimiga; o estabelecimento de um bloqueio naval impedindo que a esquadra do inimigo saisse de suas bases; e obter o grau de controle necessário por meio dos combates navais.
Em relação a estratégia também existem importantes áreas que se relacionam entre si: a Política que estabelece os objetivos (o que fazer), o Poder Naval que indica os meios disponíveis (com o que fazer) e a Estratégia propriamente dita que formula a melhor maneira de empregar os meios (como fazer).
Nesse sentido, uma força naval organizada, as posições estratégicas, como por exemplo ocanal do Panamá e as comunicações marítimas (tráfego mercante) passaram a ser objetivos estratégicos no mar. Para as nações insulares (Japão e Inglaterra) as comunicações marítimas são essenciais.
O Almirante norte-americano Alfred Thayer Mahan (1840-1914), conceituado escritor sobre temas relacionados à história naval, publicou um conjunto de obras que influenciou todo o pensamento estratégico no início do século XX. Um dos precursores da geopolítica, defendia a tese de que o domínio do mar era fundamental nas relações políticas internacionais; estabeleceu o conceito de poder marítimo, onde o somatório de recursos integrados de uma nação para a utilização do mar definia o poder e a riqueza dos povos. Mahan estimulava a projeção do poder marítimo, fato que acarretou a aquisição do Hawai pelos norte-americanos.
Considerava os Estados Unidos da América uma grande ilha cercada por dois oceanos: o Atlântico e o Pacífico. Portanto, poderiam se comunicar e facilitar o apoio entre suas esquadras: nasceu, assim, o projeto do Canal do Panamá. Mahan estabeleceu ainda, fontes ou elementos para que um país tivesse maior ou menor grau de desenvolvimento do poder marítimo: posição geográfica, configuração física e extensão do território, caráter do povo e caráter do governo. Certamente, as idéias do Almirante Mahan, contribuíram para a capacidade de projeção de poder dos EUA, sendo um dos pilares sobre o qual se apoia a chamada “Pax Americana”.
A partir do século XX, os meios navais passaram por grandestransformações tecnológicas na construção naval, na propulsão e no armamento. As guerras no marnão mais se restringiriam aos navios de guerra. O poder de fogodo submarino e a capacidade ofensiva da aviação embarcada,nas duas grandes guerras mundiais,trouxeram uma nova dimensão aos conflitos armados.
A Estratégia naval não é um fim em si mesma. Ela tem por objetivo o controle do mar, que cabe a força naval organizada por meio de uma batalha decisiva ou de um bloqueio.
Finalmente, cabe ressaltar que a Estratégia possui uma característica interdisciplinar. À História Naval que diz respeito,mais especificamente, a guerra no mar, é um laboratório útil nos estudos estratégicos para as operações navais do presente e do futuro.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. LIDDELL, H. As grandes guerras da história. São Paulo, Ibrasa. 1982.
2. JUNIOR, Haroldo Basto Cordeiro. DE ARS BELLUM. O estado da arte bélica no inicio do século XX. Revista Marítima Brasileira, Rio de Janeiro, v. 121, n. 01/03, jan/mar. 2001.
3. ALBUQUERQUE, Antônio Luiz Porto; SILVA, Léo Fonseca e. Fatos da História Naval. 2.ed. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha. 2006.
4. VIDIGAL, Armando e de Almeida, Francisco Eduardo Alves. Guerra no Mar: batalhas e campanhas navais que mudaram a história. Record. 2009.