Prof. Dr. Ricardo Pereira Cabral
Invasão Holandesa
A invasão holandesa está ligada, inicialmente, aos desdobramentos da União Ibérica (1580-1640) e do processo de independência dos países baixos da Dinastia Habsburgo da Espanha. Em meio a luta pela independência, a formação das República das Províncias Unidas, o rei Felipe II, determinou a proibição do comércio com os holandeses. Estes eram grandes investidores na agromanufatura do açúcar e de sua distribuição na Europa, atuavam ainda no envio de máquinas, equipamentos e escravos as regiões produtoras.
A resposta holandesa a proibição foi o envio de expedições militares visando atacar o comércio luso-espanhol e os centros produtores, como por exemplo o expedição do almirante Oliver van Noort, de 1598-1601, que realizou ataques no Rio de Janeiro, Chile, Peru e Filipinas. Outra expedição foi a de Joris van Spieelbergen, de 1614-1618. Ambas as expedições não tiveram muito sucesso.
Este quadro iria mudar com a criação da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais, CIO (1621) que organizou dois grande ataques ao Brasil, em Salvador (1624-1625) e a Pernambuco, em 1630. Neste conseguiram conquistar, se estabelecer e se expandir, até serem expulsos em 1654, por um combinado de forças luso-brasileiras.
Cumpre ressaltar que Portugal já era alvo de uma série de ações de coros e pirataria por parte de espanhóis, franceses, ingleses, holandeses e árabes. Todos estes povos estavam competindo pelo acesso as fontes produtoras de especiarias e o controle sobre essas rotas. A introdução da agromanufatura do açúcar faz parte do projeto português de criar alternativas a sua parcela cada vez menor no comércio de especiarias e ao mesmo tempo ocupar a terá descoberta com uma atividade econômica na produção de um artigo com forte demanda na Europa.
Em 10 de maio de 1624, a Companhia das Índias Ocidentais (CIO) enviou uma expedição composta de 26 navios e 1.700 homens, comandada pelo almirante Jacob Willekens. Inicialmente, a expedição foi bem sucedida. A resistência dos portugueses em Salvador superada com facilidade.
Com a queda de Salvador, a oposição ficou a cargo de Matias de Albuquerque, governador-geral e governador de Pernambuco. Este enviou reforços à Bahia e iniciou uma guerra de guerrilhas contra os holandeses. O governador do Rio de Janeiro enviou Salvador Correia de Sá e Benevides uma expedição com duas caravelas, duas canoas de guerra soldados e índios que ajudaram na luta contra o invasor.
Em 1625, a União Ibérica enviou uma armada composta por 52 navios, sendo 28 navios de guerra espanhóis e 7 portugueses, transportando cerca de doze mil homens. A expedição foi comandada por Dom Fradique de Toledo Osório e pelo general português Dom Manuel de Meneses. Essa expedição, a maior até então enviada ao Atlântico Sul, derrotou e expulsou os invasores holandeses neste mesmo ano.
O enorme gasto da Companhia das Índias Ocidentais com a fracassada invasão a Salvador foi, plenamente, recuperado anos mais tarde, num audacioso ataque corsário, no mar do Caribe. Na Batalha da Baia de Matanzas, em 1628, o Almirante Piet Heun interceptou a frota espanhola que transportava o carregamento anual de prata extraída nas colônias americanas. Estes recursos permitiram a CIO financiar uma nova invasão, desta vez ao principal centro produtor de açúcar, Pernambuco.
Invasão de Pernambuco
Em 1630, CIO armou um frota com 77 navios (52 navios guerra e 15 transportes e 3.780 soldados), sob o comando do almirante Hendrick Lonck. Os holandeses bloquearam o porto e o exército tomou Olinda e Recife. A seguir foram se expandindo pela região açucareira até a área entre o rio São Francisco e o rio Grande.
Em 1631, a União Ibérica reagiu enviando uma esquadra composta por 12 navios espanhóis e 5 portugueses, comandada por D. António Oquendo. Esta força naval tinha como missão transportar 2.000 soldados para a Bahia. Está tropa a reforçaria as tropas que já combatia os holandeses. As tropas luso-brasileiras usavam a tática de guerrilhas, já que no mar não tinha como contestar a superioridade naval holandesa naquele momento. No entanto, os reforços enviados e a guerrilha não impediram os holandeses de consolidar seu domínio sobre a região.
Em 1635, a União Ibérica enviou uma pequena esquadra composta por 2 galeões espanhóis e 4 portugueses, comboiando 22 navios mercantes que transportavam tropas e abastecimentos para reforçar as tropas em Salvador, o principal núcleo de resistência aos holandeses. Em 18 de janeiro de 1636, ocorreu a Batalha de Mata Redonda, vencida pelos holandeses, contra tropas luso-brasileiras e índios vinda do Rio de Janeiro e da Bahia.
Em 1637, a CIO nomeou Maurício de Nassau como novo administrado do Brasil Holandês. Este chegou com reforços doze navios com dois mil e setecentos homens. De imediato iniciou uma ofensiva para consolidar a área sob seu controle expulsando os portugueses de Porto Calvo (Alagoas) e construindo fortes em pontos estratégicos.
Contato com apoio de parte da elite açucarei e popular, Nassau organizou milícias para a defesa do Brasil Holandês.
Em 8 de abril de 1637, Nassau partiu com uma esquadra de 36 unidades com 3,6 mil europeus e mil índios, seu objetivo: conquistar Salvador, o principal bastião defensivo português no Nordeste brasileiro. Em 16 de abril, teve início o assalto a Salvador, sem muita luta a guarnição dos fortes de Santo Alberto, São Felipe e São Bartolomeu se renderam. Mas as forças luso-brasileiras detiveram o avanço holandês e Nassau voltou para Recife. Na verdade, apesar da liderança de Nassau, a ousadia de suas ações e do início favorável, as forças holandesas não eram fortes o suficientes para tomar Salvador.
Em 1639, foi enviada para o Brasil uma nova expedição para expulsar os holandeses. A esquadra era composta por galeões portugueses e navios espanhóis das esquadras de Cadiz e do Levante. A esquadra era constituída por 46 navios, dos quais 26 galeões, com 5 mil homens, comandado por D. Fernando Mascarenhas, conde da Torre. O ponto de reunião marcado em Cabo Verde foi desastroso, a esquadra demorou a se reunir, os suprimentos e mantimentos eram precários, as tripulações sofreram com epidemias e vários homens morreram. Com a chegada dedos navios previsto a esquadra traçou a derrota para o Brasil. O plano era seguir para Recife, atrair a esquadra holandesa para uma batalha naval e destruí-la. No entanto, ao chegar em Recife, os holandeses não saíram para o combate, pois o grosso de suas forças estava na Bahia, fazendo com que a esquadra luso-espanhola seguissem rumo a Salvador
Em março Nassau recebeu reforços: 1,2 mil soldados e sete navios, enviados sob o comando do coronel polonês Crestofle d’Artischay Arciszewski, nomeado general, e uma veterano da guerra no Nordeste e cheio de experiência contra a guerrilha brasileira.
Ao longos dos meses Rio de Janeiro e Buenos Aires enviaram suprimentos. Em outubro, cerca de mil homens e suprimentos chegaram dos Açores.
Em 21 de novembro de 1639, as forças portuguesas estavam prontas para desafiar o domínio holandês. A esquadra era composta por 82 navios: 13 galeões, 7 urcas e 1 patacho, todos de guerra, 27 transportes e 34 navios ligeiros, estes aparelhados no Brasil. A força de assalto era composta por cerca de 5 mil homens e 12 canhões. As tropas em terra eram chefiadas pelo conde Banoli, André Vidal de Negreiros, Antônio Felipe Camarão e Henrique Dias. Para fazer frente a esta força, Nassau tinha 41 navios e 2.800 homens embarcados, comandada pelo Almirante Hendrik Corneliszoom Lonck. A esquadra holandesa estava posicionada em frente a Olinda.
Nassau optou por fazer o maior esforço no mar. As esquadras se enfrentaram de Alagoas à Paraíba, entre Itamaracá e Rio Grande, em uma série de quatro batalhas navais, nas maiores batalhas navais travadas em frente ao litoral brasileiro. A sequência de batalhas foram: dia 13 de janeiro de 1640, diante de Ponta das Pedras; dia 14, na altura da cidade de Paraíba; dia 17, ao largo de Cunhaú, hoje Praia da Pipa. Houve poucas baixas e cada uma teve resultados indecisos, mas estrategicamente foram favoráveis aos holandês, pois a esquadra portuguesa não conseguiu realizar o assalto anfíbio e, por fim, se dispersou. O Conde da Torre desembarcou uma tropa de 1,2 mil soldados, na baía de Touros, comandados por Luís Barbalho Bezerra, que regressou à Bahia pelo interior.
“Nassau atribuiu o fracasso luso-espanhol à escolha de um comandante ineficaz para comandar força tão poderosa, devido à praxe de nomear aristocratas inexperientes, como Torre, no pressuposto que sua nobreza era mais apta a garantir a disciplina; outro motivo fora a mortandade que atacara a armada em Cabo Verde, obrigando-a a escala em Salvador; e a ação dos ventos, que haviam desfavorecido sempre o inimigo.”
Em 1 de dezembro de 1640, os portugueses romperam a União Ibérica. Este fato não vai alterar a situação no Brasil. Os portugueses firmam uma aliança com a Inglaterra.
Nassau, apesar das conversações entre os governos, tomou uma série de iniciativas para expandir os domínios da CIO: ocupou Sergipe, Ceará e Maranhão, atacou e conquistou Luanda, Benguela, São Tomé e Axim (na Guiné). Em novembro de 1640, a CIO financiou uma expedição para tomar a ilha de São Luís, comandada por Jan Cornelisz e Hans Koin. Os colonos portugueses se estabeleceram Taputapera onde iniciaram a luta para expulsar os invasores, liderados por Antônio Muniz Barreto. Nassau ainda planejou ações contra Buenos Aires e o Rio de Janeiro, mas não teve tempo para implementá-las, e enviou uma expedição ao sul do Chile a fim de verificar a possibilidade de estabelecer um porto avançado. Em 30 de setembro de 1643, a CIO dispensou Nassau de suas funções e ele retornou à Europa.
Em 1645, teve início a Insurreição Pernambucana, liderada por André Vidal de Negreiros, João Fernandes Vieira, Henrique Dias e Felipe Camarão com o objetivo de expulsar os holandeses. As principais batalhas foram do Monte das Tabocas (3/8/1645), Batalha de Casa Forte (17/8/1645), 1ª Batalha de Guararapes (18 e 19 de abril de 1648) e a 2ª Batalha de Guararapes (19/2/1649) onde os holandeses sofreram pesadas derrotas.
Em 1652, o rei D. João IV enviou uma esquadra composta por 13 navios de guerra e 64 navios mercantes armados, sob o comando de Pedro Jaques de Magalhães. Em 20 de dezembro de 1653, a esquadra cercou Recife. Em 15 de janeiro de 1654 os luso-brasileiros, comandados por André Vital, atacaram o Recife. No dia 23 os holandeses fizeram uma proposta de paz que foi aceita pelos Aliados. Em 26 de janeiro de 1654, os lideres holandeses assinaram a rendição.
Imagem de Destaque: Multi Rio: História do Brasil
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Bibliografia
– A Guerra Holandesa: Conflito, Negociação e Imaginário, de Evaldo Cabral Mello.
– GUEDES, Max Justo (ORG.). História Naval Brasileira. 2º Vol., Tomo I A. Rio de Janeiro: SDM, 1990.
Sites consultados
Tok de História: 1640 – A maior batalha naval ocorrida nos mares brasileiros
Wikipédia: Companhia Holandesa das Índias Ocidentais
Wikipedia: John Maurice, Prince of Nassau Siegen
Professor de História formado pela UGF. Mestrado e Doutorado em História pela UFRJ. Autor de artigos sobre História Militar e Geopolítica.
Muito interessante os relatos. Sou carioca mas morei 5 anos no nordeste e é notável os traços biográficos e a influência dos holandeses naquela região. Até aonde eu sei, Maurício de Nassau foi muito competente e administrator como poucos. O retorno a Holanda por ordens do rei que privilegiou um parente in competente, para substituir Nassau foi a principal razão do insucesso holandês.
Obrigado pelo comentário
Não faz sentido dizer “luso-brasileira”, simplesmente luso ou portuguesa, o brasil como país não existia nesta altura, as tropas eram todas portuguesas, sendo originais de Portugal (reinóis), ou os colonos portugueses.
Toto, agradeço pelo comentário, quanto a sua colocação, penso que não devemos entrar nessa polêmica, tem gente que diz que os nascidos aqui já eram chamados de brasileiros pelos portugueses, mas as pessoas que nasceram aqui se diziam portugueses também. Existia uma grande discriminação contras os nascidos na terra e o acesso aos cargos públicos era muito difícil, por isso essa posição. Nem com o Reino Unido deixou de existir essa discriminação, com a Independência, passou a existir uma discriminação contra os portugueses, que só será resolvida na regência, com determinados cargos sendo exclusivos de brasileiros natos
Completamente de acordo!