Estimativa atual do efetivo das forças russas na Ucrânia

de

Rodolfo Laterza

1. Aspectos gerais

No início de 2023, em inúmeras análises sobre o alcance e perspectivas de sucesso da ofensiva de primavera das Forças Armadas da Ucrânia (FAU) na mídia ocidental e ucraniana, informações indicando o tamanho das forças russas ativas na Ucrânia, bem como o número de forças russas na reserva, começaram a ser veiculadas e difundidas com números discrepantes.

Deve-se notar que o Ministério da Defesa da Rússia nunca forneceu oficialmente informações públicas sobre o número de grupos russos regulares na zona de combate.

De acordo com o canal de telegrama “Militarista”, referindo-se a especialistas ocidentais, no final de 2022, além de 300 mil mobilizados, cerca de 100 mil voluntários chegaram às forças russas localizadas na zona de combate distribuídas entre numerosos Batalhões de Voluntários – identificados pelo acrônimo “BARS” ou assinaram um contrato com PMCs, notadamente com o Wagner Group.

Há evidências de que, no final de abril de 2023, as forças russas regulares e proxies (Batalhões de Voluntários, regimentos da Rosguardia e combatentes de empreiteiras militares privadas como o Wagner Group)  concentrava cerca de 300-350 mil combatentes ao longo de todo perímetro operacional, abrangendo desde o eixo de Svatovo-Kreminna a todo setor do Donbass, bem como nas direções de Zaporozhye e Kherson, compreendendo estimados 113 BTGs (grupos táticos de batalhão) nas regiões de Zaporozhye e Kherson e 205 dessas unidades na direção de Donetsk e Svatovo-Kreminna.

No total, no momento do início do conflito a partir de 24 de fevereiro de 2022, o número do exército russo na Ucrânia (Donbass, a direção de Kharkov e o agrupamento perto de Kiev) era de cerca de 80 mil soldados e cerca de 50 mil combatentes das milícias separatistas de Donetsk e Luhansk, além de aproximadamente 7 mil chechenos institucionalizados em formações da Rosguardia (espécie de Guarda Nacional da Federação Russa) e em torno de 10 mil combatentes de empreiteiras militares privadas (Private Military Company)  permanecendo com este contingente até aproximadamente outubro de 2022, quando os mobilizados em decreto do Presidente Putin começaram a chegar a setores da linha de frente em reforço a áreas com escassez de efetivo e que sofriam ataques das forças ucranianas no âmbito das bem sucedidas ofensivas de agosto-setembro, notadamente nas regiões de Kharkiv e Kherson.  No outono de 2022 e início de 2023, a essas 130.000 baionetas, outros 300.000 Kuzmichi (convocados reservistas) e 100.000 voluntários de novos Batalhões de Voluntários BARS e contratados de PMCs foram adicionados.

No total, o número de combatentes russos na Ucrânia, na época da primavera de 2023, em formações militares oficiais e informais é de aproximadamente 370 mil, convergindo com as estimativas do Diretório de Inteligência Militar das Forças Armadas da Ucrânia, conhecido pelo acrônimo  “GUR”.

Este efetivo compreende combatentes que agora estão posicionados na linha de frente e na retaguarda, divididos em 48 brigadas, 122 regimentos e 315 outras formações diversas. A partir desse número, fica claro que a inteligência da Ucrânia não leva em conta a reserva operacional russa mobilizada e em treinamento, cujo número chega a cerca de 150.000 – 200.000 combatentes.

http://duma.gov.ru/en/news/55276/

2. Reserva frontal do exército russo

O presidente russo Vladimir Putin, em 21 de dezembro de 2022, falou sobre a reserva de linha de frente do exército russo, localizada longe da zona de combates no final de 2022, em uma reunião ampliada do colégio do Ministério da Defesa da Federação Russa, citando um número de 150 mil pessoas.

Na linha de contato, de acordo com a inteligência britânica, existem cerca de 300 mil combatentes russos em formações regulares e voluntárias, bem como cerca de 150-200 mil pessoas na reserva frontal ainda em território russo mas mobilizáveis para futuros planejamentos operacionais (principalmente nas regiões de Kursk e de Belgorod da Federação Russa e na Bielo-Rússia – neste caso em torno de 50 mil soldados dentre o número total acima citado).

Como é sabido, 300.000 pessoas foram convocadas para as fileiras das forças armadas desde o final de setembro de 2022 a partir de Decreto de Mobilização Parcial expedido pela Presidência da Federação Russa. Alguns deles já estão na zona de guerra, reforçando linhas defensivas ou atuando em operações limitadas de reconhecimento de força. Segundo o ministro da Defesa, Sergei Shoigu em declarações recentes, cerca de 150 mil pessoas estão sendo treinadas em campos de treinamento militar.

Estipulamos três versões hipotéticas do propósito de tal reserva mobilizada pelo Ministério da Defesa da Rússia, cuja localização e número exatos são desconhecidos. Supõe-se que os grupos de reserva estejam localizados a pelo menos 300 km da linha de frente. Elencamos as seguintes questões hipotéticas sobre a mantença de uma reserva frontal significativa pelo órgão superior de defesa da Federação Russa:

I) Acredita-se que esta reserva, provavelmente composta por militares mobilizados, seja reabastecida, se necessário, por unidades de combate, uma vez que o número de unidades de linha de frente é ainda insuficiente para os objetivos militares totais russos, agravado por perdas irrecuperáveis em combate e em situação de não combate, rotação de pessoal e pausa operacional, fatores que devem ser levados em conta na avaliação de qualquer contexto tático-operacional em um conflito militar de longa duração.

II) Em nossa avaliação, o Ministério da Defesa russo não tem condições de fornecer rapidamente a um grande número de tropas veículos leves e blindados diversos, MLRS e sistemas de artilharia, pois que no momento grande parte desses equipamentos está em linhas de montagem das estruturas fabris russas para serem em seguida direcionados para a zona de operações, substituindo as significativas perdas em armas ocorridas desde fevereiro de 2022.

III) A título exemplificativo, para preparar uma brigada russa padrão de infantaria motorizada em tempo integral, são necessários de cerca de 100 unidades de veículos blindados leves, como veículos blindados de transporte de pessoal (APC), veículos de combate de infantaria (IFV) e veículos blindados com rodas do tipo Tiger. Além disso, a brigada deve ter pelo menos 30 tanques principais de batalha (MBT), além de sistemas de artilharia, MLRS e morteiros.

Também existe a opinião de que cerca de 150-200 mil combatentes da reserva ainda não empregada na zona de guerra são necessários para a uma eventual contra-ofensiva russa, sobre a qual a imprensa mundial parou de falar na primavera de 2023, tendo em vista os preparativos da ofensiva ucraniana.

https://www.rand.org/blog/2022/08/russian-forces-in-ukraine-muddling-through.html

3. Considerações finais

Após a captura da cidade de Bakhmut (agora denominada pelos russos como Artemovsk), o grupo PMC Wagner, que já atingiu o tamanho de um corpo de exército de até 50 mil combatentes no auge das hostilidades em Bakhmut e arredores, irá se submeter a uma pausa operacional para reabastecimento e recomposição de efetivo diante das necessidades decorrentes de perdas em combate no Donbass. Uma vez recomposta sua capacidade de combate plena, junto com as unidades das Forças Aerotransportadas Russas estacionadas nesta área, poderia partir para novos ataques, abrindo espaço operacional e movendo-se na direção de Slavyansk, Kramatorsk, Konstantinova e Chasov Yar.

Entretanto, para tal intento, será necessário criar segundos escalões reforçados para as tropas que avançam e retirar a reserva não utilizada, tendo em vista o efetivo ainda insuficiente para novas ofensivas e operações de controle de área que estabilizem as novas áreas capturadas.

Um dos grandes erros de planejamento operacional da Rússia neste conflito foi o uso de efetivo insuficiente de suas forças regulares, dependendo de uma força cheia de proxies, com muitas formações paramilitares e informais. Só de voluntários contratados e inseridos em batalhões assim categorizados, foram em torno de 117 mil mobilizados;  PMCs, em torno de 50 mil, principalmente contestados do Wagner Group; combatentes chechenos, 7 regimentos e 4 Batalhões, compondo cerca de 20 mil em junho do ano passado para depois diminuir para em torno de 10 mil; egressos das milícias separatistas de Donetsk e Luhansk que passaram a compor as formações militares russas, após os referendos não legalmente reconhecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU), os quais incorporaram tais regiões à jurisdição da Federação Russa, em torno de 70 mil.

Mesmo com o reforço dos mobilizados de setembro de 2022 e novos voluntários arregimentados, o limitado efetivo das forças russas empregado no teatro de operações da Ucrânia ainda é um desafio estrutural para a realização de operações ofensivas, o que justifica parcialmente a posição estratégica de defesa ativa em vigência neste período de primavera, no qual se esperou a iniciativa operacional ofensiva ucraniana. As FAU possuem em torno de 736 mil soldados bem armados pela OTAN no teatro de operações, incluindo as brigadas de defesa territorial precariamente mobilizadas e treinadas, o que constitui um desafio para a conclusão dos objetivos militares da Rússia.

Imagem de Destaque: https://www.japantimes.co.jp/news/2022/04/16/world/russia-ukraine-mariupol-kyiv/

4. Fontes consultadas

www.focus.ua

www.fpri.org

https://news-front.info/

www.pravda.ua

www.rusi.org

https://worldview.stratfor.com/

Delegado de Polícia, historiador, pesquisador de temas ligados a conflitos armados e geopolítica, Mestre em Segurança Pública

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