1943: O Exército Vermelho reconquista Kiev

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Equipe HMD

A Ofensiva Estratégica de Kiev foi a primeira série de complexas operações militares, deflagradas pelos soviéticos, entre 1 de outubro e 22 de dezembro de 1943, conhecidas como 2ª batalha de Kiev e que envolveu três operações de nível estratégico desencadeadas pelas forças soviéticas e um contra-ataque de nível operacional pelas forças alemãs (24/01 de outubro de 1943).

Após a derrota da ofensiva alemã “Unternehmen Zitadelle” na Batalha de Kursk (para saber mais ver https://historiamilitaremdebate.com.br/a-batalha-de-kursk-o-ponto-de-virada-da-frente-oriental/), as forças soviéticas lançaram a Operação Belgorod-Kharkov (3 a 23/8/1943), empurrando o Heeresgruppe Süd (Grupo de Exército Sul) do marechal Erich von Manstein de volta ao rio Dniepr. O Stavka (alto comando soviético) ordenou à Frente Central e a Frente Voronezh que forçassem a travessia desse rio e conquistassem cabeças de ponte na sua margem ocidental. Quando este esforço não teve sucesso, a tarefa foi passada para a 1ª Frente Ucraniana do General Nikolai F. Vatutin (posteriormente Frente Voronezh) com algum apoio da 2ª Frente Ucraniana do General Ivan S. Konev (posteriormente Frente das Estepes). A 1ª Frente Ucraniana conseguiu assegurar as cabeças de ponte tanto ao norte, como ao sul de Kiev.

https://warfarehistorynetwork.com/article/the-battle-of-kiev-how-it-brought-about-an-end-to-nazi-terror/

A sequência das operações soviéticas no front de Kiev foram as seguintes: a 1ª Operação Ofensiva Estratégica de Kiev (24/9 a 01/10) pela Frente Central e a Frente Voronezh; a 2ª Operação Ofensiva Estratégica de Kiev (13/10 e 03/11) e a Operação Defensiva Estratégica de Kiev (13/11 a 22/12). A primeira delas incorporou a Operação Ofensiva Chernobyl-Radomysl (1 a 4/10), a Operação Defensiva Chernobyl-Gornostaipol (3 a 8/10), a Operação Ofensiva Lutezh (11 a 24/10) e as duas Operações Ofensivas Bukrin (12 a 15/10 e 21 a 24/10). Como verificamos foram um mês deoperações ofensivas em vários pontos da linha de frente, os soviéticos usaram sua superioridade em meios e combatentes para sobrecarregar as já cansadas tropas nazistas.

Entre a 2ª Ofensiva Estratégica de Kiev e a Operação Defensiva Estratégica de Kiev veio o contra-ataque alemão do 3º Panzerarmee (exército panzer) do coronel-general Erhard Raus a fim de explorar as fragilidades das linhas soviéticas e estabilizar a linha de frente.

O Exército Vermelho ataca

Em Outubro de 1943, os exércitos de Vatutin enfrentavam graves dificuldades ao tentarem sair do terreno acidentado da “curva de Bukrin”, a cabeça de ponte do sul soviético perto da aldeia de Veliki Bukrin, na península no rio Dnieper. O XXIV Panzerkorps do general Walther Nehring, mantinha uma posição defensiva eficaz com suas quatro divisões (nenhuma blindada), apertou severamente as forças soviéticas adversárias e, como resultado, Vatutin decidiu concentrar seu esforço na cabeça de ponte norte, em Lutej.

https://kpi.ua/en/833-1

O 3º Exército Blindado de Guardas, do general Leytenant Pavel S. Rybalko, moveu-se para o norte na direção da cabeça de ponte de Lutezh, sob a cobertura da escuridão e de ataques diversionários, saindo da cabeça de ponte da curva de Bukrin. Os preparativos soviéticos foram consideráveis, incluindo a instalação de 26 pontes e 87 balsas. Muitas das pontes soviéticas foram construídas abaixo da linha d’água, tornando-as difíceis de detectar e, portanto, de serem destruídas pela artilharia alemã. Os soviéticos lançaram vários ataques divisionários e a construíram pontes falsas visando ludibriar os alemães quanto ao ponto verdadeiro do ataque principal. O apoio de fogo foi fornecido por cerca de 7 mil obuseiros e morteiros, e o apoio aéreo foi fornecido por 700 aeronaves de combate. O 27º Exército, do General Leytenant Sergei G. Trofimenko, e o 40º Exército, do General Leytenant Filipp F. Zhmachenko, lançaram o ataque diversionário soviético em Bukrin em 1/11, dois dias antes do previsto, mas conseguiram avançar apenas 1,5 km, antes de serem rechaçados pela bem posicionada defesa alemã.

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Os historiadores militares soviéticos alegaram sucesso total nas medidas de dissimulação do ataque soviético, mas na verdade os alemães identificaram corretamente o setor em que o ataque soviético seria feito e enviaram reforços de unidades blindadas para a área. O diário de guerra do 4º Panzerarmee referia-se à principal investida soviética na área a norte de Kiev, em 3 de Novembro, como “a ofensiva que esperávamos”. No entanto, os alemães não tinham certeza se o ataque soviético previsto tinha objetivos de longo alcance desde o início ou se se destinava apenas à captura de uma cabeça de ponte inicial para exploração posterior.

Na madrugada de 3 de novembro de 1943, o 4º Panzerarmee foi atingido por um enorme bombardeio de artilharia. O 38º Exército e o 60º Exército soviéticos atacaram então na primeira onda, mas não conseguiram romper as posições do VII Corpo de Exército, do General Anton Dostler. Um dia depois, o 3º Exército Blindado de Guardas e o I Corpo de Cavalaria de Guardas foram adicionados ao ataque, forçando o VII Corpo a recuar e evacuar Kiev.

Em 6 de novembro, os soviéticos tomaram Kiev. A segunda fase da ofensiva soviética começava, tendo como objetivos iniciais da 1ª Frente Ucraniana a libertação de Zhitomir, Korosten, Berdichev e Fastov e romper a ligação ferroviária para o Heeresgruppe Mitte, abrindo assim o caminho para o objetivo final de cercar o Heeresgruppe Süd.

Em 7 de novembro, as pontas de lança soviéticas alcançaram o importante nexo ferroviário em Fastov, cerca de 50 km a sudoeste de Kiev.

https://www.flamesofwar.com/Default.aspx?tabid=111&art_id=1816

O plano soviético inicialmente correu bem para a 1ª Frente Ucraniana de Vatutin. No entanto, Manstein ficou preocupado e, enquanto os tanques de Rybalko se moviam pelas ruas de Kiev (6/11), o comandante do Heeresgruppe Süd solicitou a Hitler libertar o XLVIII Panzerkorps e o General Heinrich Eberbach (a partir de 15/11 o General Hermann Balck) XLVIII Panzerkorps e General XL Panzerkorps de Ferdinand Schörner (a partir de 12/11 de Balck) para fornecer ao grupo de exército força suficiente para a recaptura de Kiev. O XLVIII Panzerkorps foi entregue ao comando de Manstein, mas Hitler recusou-se a desviar o XL Panzerkorps e, em 3 de novembro, substituiu Hoth como comandante do 4º Panzerarmee pelo coronel-general Erhard Raus, que recebeu ordens de conter o ataque soviético, proteger o flanco norte do Heeresgruppe Süd e manter as linhas de comunicações com o Heeresgruppe Mitte.

Várias fontes indicam 6 de Novembro como a data para a libertação de Kiev, mas na verdade a 1ª Brigada Independente da Checoslováquia parece ter iniciado o ataque no dia 5 de Novembro atingindo o rio Dnieper no dia seguinte e depois de percorrer os subúrbios ocidentais da cidade, tornou-se a primeira unidade a chegar ao centro da cidade. Kiev foi libertada dos nazistas na manhã do dia 6 de novembro.

A Werhmacht contra-ataca

Raus passou por dificuldades, pois suas  unidades sofreram pesadas perdas nos estágios iniciais da ofensiva de Vatutin. O 4º Panzerarmee foi então reforçado, principalmente com artilharia e lançadores de foguetes. Em 7 de novembro, as divisões alemãs foram reforçadas pela chegada da recém-formada 25ª Divisão Panzer do tenente-general Georg Jauer, mas o ataque desta nova divisão a Fastov foi interrompido pelo VII Corpo de Tanques de Guardas soviético.

A 25ª Divisão Panzer havia completado apenas o treinamento individual de emergência e carecia de quantidades de armas e outros equipamentos da dotação padrão de uma divisão panzer, mas mesmo assim foi desdobrada apesar dos protestos do coronel-general Heinz Guderian, o inspetor das tropas Panzer. A 25ª Divisão Panzer tornou-se a primeira divisão panzer que não conseguiu alcançar pelo menos o sucesso ofensivo inicial na Frente Oriental. No entanto, apesar do seu fracasso, a ofensiva alemã impediu o avanço do 3º Exército Blindado de Guardas. O resto das forças soviéticas continuaram os seus ataques: o exército de Rybalko estava a apenas 65 km de Berdichev, e Zhitomir foi tomada pelo 3º Exército, em 12 de Novembro. Um fato curioso o avanço soviético foi interrompido quando os homens do I Corpo de Cavalaria de Guardas localizaram e saquearam os estoques de bebidas do comandante do 4º Panzerarmee, o coronel-general Gotthard Heinrici, ficou barato para os alemães….

Em 17 de novembro, o 60º Exército tomou Korosten e o 40º Exército moveu-se para o sul de Kiev. O única período de trégua para os alemães veio quando o 27º Exército soviético  se exauriu e passou para a defensiva na curva de Bukrin. Em 10 dias, os soviéticos avançaram 150 km e abriram uma brecha de cerca de 100 km de largura entre Heeresgruppe Mitte e Heeresgruppe Süd.

O 4º Panzerarmee estava agora em apuros, embora a situação tenha começado a mudar com a chegada do XLVIII Panzerkorps de Balck, que compreendia a 1ª SS Panzerdivision Leibstandarte Adolf Hitler do SS-Oberstgruppenführer Joseph (Sepp) Dietrich, a 1ª Divisão Panzer, do tenente-general Walter Krüger e a 7ª Divisão Panzer, do tenente-general Hasso von Manteuffel. Balck dirigiu suas forças para o norte, para Brusilov, e depois para o oeste, para retomar Zhitomir. Rybalko despachou o VII Corpo Blindado de Guardas para conter o ataque alemão, e ali desenvolveu uma grande batalha blindada que continuou até o final de novembro, quando a lama da rasputitsa de outono interrompeu todas as operações.

Com a recaptura de Zhitomir e Korosten, o 4º Panzerarmee ganhou algum descanso. Com a 1ª Frente Ucraniana de Vatutin interrompida, o Stavka liberou para esta formação reforços substanciais para recuperar o ímpeto.

Em 5 de dezembro, a lama outonal havia congelado. O XLVIII Panzerkorps empreendeu um amplo ataque ao norte de Zhitomir. Pegando as forças soviéticas de surpresa, os alemães procuraram cercar o 60º Exército e o XIII Corpo de Exército. Reforçados com as tropas aerotransportadas da 2ª Divisão Fallschirmjäger, do major-generalr Walter Barenthin (a partir de 9 de dezembro do tenete-general Gustav Wilke), os alemães dirigiram para o leste, colocando os soviéticos na defensiva. Com Fastov também sob ameaça, o 60º Exército retirou-se e entrou em defensiva em Korosten.

Vatutin foi forçado a solicitar mais reservas ao Stavka, que respondeu lhe enviando tropas para o 1º Exército Blindado e o 18º Exército. Estas novas formações, juntamente com corpos adicionais de outros setores, foram apressadamente levados para o oeste. Assim, os soviéticos conseguiram deter o avanço alemão, voltaram à ofensiva e retomaram Brusilov. Ambos os lados estavam exaustos no final de dezembro e a batalha por Kiev havia terminado.

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Considerações finais

Embora os soviéticos não tenham conseguido romper a ligação ferroviária do Heeresgruppe Mitte ou envolver o Heeresgruppe Süd, atravessaram a linha do rio Dnieper e tomaram Kiev, que era a terceira maior cidade da URSS, além de infligir baixas significativas ao 4º Exército Panzer. Por seu lado, os alemães provocaram pesadas baixas em várias formações soviéticas importantes e mantiveram aberta a ligação ferroviária vital, mas falharam na sua tentativa de cercar e destruir as pontas de lança soviéticas. Poucos dias depois do XLVIII Panzerkorps ter sido retirado para descanso e recompletamento, os soviéticos lançaram em 24 de dezembro a Operação Ofensiva Estratégica Dnieper-Cárpatos, e em 3 de janeiro de 1944, a 1ª Frente Ucraniana empurrou os alemães de volta para a fronteira soviética-polonesa de 1939.

Os soviéticos tiveram mais de 28 mil mortos, desaparecidos ou capturados, mais 89 mil feridos, perderam 271 tanques e 125 aviões. Já os alemães tiveram mais de 2.600 mortos, 13 mil feridos e 1.200 desaparecidos, além de inúmeros tanques, obuses e aviões destruídos.

Tradução e Adaptação: Prof. Dr. Ricardo Pereira Cabral

Fontes

https://en.wikipedia.org/wiki/Battle_of_Kiev_(1943)

The Battle of Kiev: How it Brought About an End to Nazi Terror

The Story Of Liberation Of The City Of Kyiv From The Nazi Troops

https://codenames.info/operation/kiev-strategic-offensive-operation/

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