Operação Mercury: o assalto aeroterrestre alemão a ilha de Creta

de

Prof. Dr. Ricardo Pereira Cabral

Em 28 de outubro de 1940, os italianos invadiram a Grécia, o Reino Unido além de apoiaram os gregos, ocuparam a ilha de Creta permitindo que as forças gregas estacionada na ilha fossem empenhadas na defesa do território continental. A posse de Creta era estratégica, pois possuía excelentes portos para a Marinha Real no Mediterrâneo Oriental que ameaçavam o flanco sudeste do Eixo e fornecia aeródromos que permitam que a Royal Air Force (RAF) apoiar as forças aliadas em terra, atacasse o tráfego marítimo e aéreo do eixo e os campos de petróleo na Romênia.

O fracasso italiano resultou na invasão alemã da Grécia (Operação Marita), com isso parte das tropas aliadas tiveram que ser evacuadas para reforçar as defesa de Creta e outras para o Norte da África.

https://www.hotel-mike.com/about-crete/battle-of-crete/

O Alto-Comando do Exército Alemão (Oberkommando des Heeres, OKH) emitiu parecer que uma ação contra Creta poderia desviar recursos da Operação Barbarossa (invasão da URSS). No entanto, Hitler avaliava a situação das operações aliadas em outros teatros, que poderiam atingir os campos de petróleo romenos, uma fonte muito importante para a Alemanha. Já os comandantes da Luftwaffe estavam entusiasmados com a ideia de tomar Creta por um assalto aéreo como uma forma de recuperar o seu prestígio arranhado pela derrota na Batalha da Inglaterra. Antes da invasão, os alemães realizaram uma campanha de bombardeio para estabelecer a superioridade aérea e forçaram a RAF a deslocar seus aviões para Alexandria, no Egito.

Entre marco e abril de 1941, a inteligência britânica, a partir da quebra do código da Enigma, sabia dos preparativos para a invasão de Creta. No entanto, várias situações ocorreram e colocaram os britânicos na dúvida se realmente Creta seria o alvo ou uma operação de distração para um ataque a Chipre ou a Síria. Os britânicos só puderam ter certaza no início de maio quando os preparativos alemães promovidos pelo major-general Kurt Stdent estavam praticamente concluídos.

Já a Abwehr (inteligência alemã), comandada pelo almirante Wilhelm Canaris, deu informes imprecisos e muito otimistas. O general Alexander Löhr, o comandante do teatro de operações, estava convencido de que a ilha poderia ser conquistada com duas divisões e por isso decidiu manter a 6ª Divisão de Montanha em Atenas como reserva, apesar das informações da inteligência do XII Exército ter passado um quadro mais próximo da realidade (mas também subestimou os efetivos gregos e britânicos empenhados na defesa da ilha.

https://www.iwm.org.uk/history/what-was-the-battle-of-crete

Em 20 de maio de 1941, foi deflagrada a Operação Mercury, um ataque a ilha de Creta com um assalto aeroterrestre de paraquedistas alemães da 7ª Divisão Aérea e tropa aerotransportada da 5ª Divisão de Montanha. Devido ao controle de área marítima exercido pela Marinha Britânica (Royal Navy – RN) e a superioridade aérea alemã, a opção o Alto Comando da Wehrmacht (Oberkommando der Wehrmacht – OKW) foi realizar um assalto aéreo.

Os nazistas já feito ataques menores de tropas paraquedistas (Fallschirmjäger) e tropas aerotransportadas em planadores nas invasões da Dinamarca e Noruega, Bélgica, Holanda, França e Grécia continental. Na Grécia, as Fallschirmjäger foram despachadas para capturar a ponte sobre o Canal de Corinto, que estava sendo preparada para demolição pelo Corpo de Engenheiros Reais. Os engenheiros alemães desembarcaram perto da ponte em planadores, enquanto os Fallschirmjäger atacou a defesa do perímetro. A ponte foi danificada nos combates, o que retardou o avanço alemão e deu aos Aliados tempo para evacuar 18 mil soldados para Creta e 23 mil para o Egito, embora com a perda da maior parte de seu equipamento pesado.

A partir do final de abril o OKW começou a deslocar para a Grécia o Fliegerkorps XI constituído de 280 bombardeiros de longo alcance, 150 bombardeiros de mergulho, 90 Bf 109s, 90 Bf 110s e 40 aeronaves de reconhecimento. Em apoio o Fliegerkorps VIII desdobrou 530 aeronaves de transporte Ju 52 e 100 planadores. O ataque em terra fiaria por conta da ª Divisão Flieger, que pousaria de pára-quedas e planador, além da 5ª Divisão de Montanha. O efeito era em toro de 22 mil combatentes. O assalto aero terrestre tinha como objetivo capturar  pontos importantes e os aeródromos. A fim de apoiar o ataque alemão a Creta, onze submarinos italianos foram empenhados nas águas no entorno Creta ou das bases britânicas de Sollum e Alexandria, no Egito.

Os Aliados tinham desdobrados a 2ª Divisão da Nova Zelândia, menos a 6ª Brigada e o comando da divisão, o 19º Grupo de Brigadas Australianas e a 14ª Brigada de Infantaria da 6ª Divisão Britânica, o efetivo era cerca de 15 mil infantes da linha de frente da Commonwealth,reforçada por cerca de 5 mil combatentes equipados como infantaria e uma bateria de artilharia australiana. Em meados de maio a guarnição recebeu o 2º Batalhão do Regimento de Leicester. Em 17 de maio, a guarnição de Creta era comporta por 15 mil britânicos, 7.750 neozelandeses, 6.500 australianos e 10.200 gregos. Na manhã de 19 de maio, mais 700 homens dos Highlanders Argyll e Sutherland.

https://en.wikipedia.org/wiki/Battle_of_Crete#/media/File:Battle_of_crete.svg

Unternehmen Merkur (Operação Mercúrio)

Ao autorizar a Operação Mercúrio, Hitler determinou que as forças utilizadas deveriam vir de unidades aerotransportadas e aéreas já na área e as unidades destinadas a Unternehmen Barbarossa deveriam concluir as operações antes do final de maio e principalmente, a Operação Barbarossa não deveria ser adiada pelo ataque a Creta, que deveria começar em breve ou ser cancelada.

Com isso o planejamento da operação foi apressado e ocorreram várias improvisações. Os aeródromos de Maleme, Heraklion e Rathymno eram os principais alvos, com ênfase no primeiro. Maleme oferecia várias vantagens: era o maior aeródromo e grande o suficiente para aeronaves de transporte pesado, estava perto o suficiente do continente para cobertura aérea de caças Messerschmitt Bf 109 baseados em terra e estava perto da costa norte, por onde reforços marítimos poderiam ser trazidos rapidamente.

A força de invasão foi dividida em Kampfgruppen (grupos de batalha), Centro (codinome Marte), Oeste (codinome Cometa) e Leste (codinome Orion), cada um com um codinome seguindo o tema clássico estabelecido por Mercúrio; 750 soldados transportados por planadores, 10 mil paraquedistas, 5 mil soldados de montanha transportados por via aérea e 7 mil soldados transportado por navios foram alocados para a invasão.

A força de invasão foi dividida em Kampfgruppen (grupos de batalha), Centro, Oeste e Leste. A maior proporção das forças estavam no Grupo Oeste, cujo objetivo era Malene. A teoria aerotransportada alemã foi baseada no paraquedismo de uma pequena força em aeródromos inimigos. A força capturaria o perímetro e os canhões antiaéreos locais, permitindo que uma força muito maior pousasse por planador.

https://www.thoughtco.com/world-war-ii-battle-of-crete-2361468

A batalha

As 8 h do dia 20 de maio de 1940, começou o assalto aeroterrestre dos paraquedistas alemães ao aeroporto de Melede e a cidade de Chania, posições defendidas por unidades militares e civis gregas e tropas neozelandeses. Os fallschirmjäger e as tropas transportadas nos planadores sofreram pesadas perdas e não conseguiram conquistar seus objetivos

Uma segunda onda de transportes alemães apoiados por aviões de ataque da Luftwaffe e Regia Aeronáutica, chegou à tarde, lançando mais pára-quedistas e tropas de assalto  transportadas  planadores. Após reagruparem as tropas nazistas atacaram Rethymno e Heraklion, os defensores já os esperavam e provocaram muitas baixas, mas mesmo assim tiveram que retrair para uma posição defensiva na estrada para Cnossos.

Naquela altura da batalha, o plano alemão de atacar em quatro lugares para maximizar a surpresa, em vez de se concentrar em um só objetivo, parecia ter falhado. Os alemães desconheciam o motivo de terem falhado (a quebra dos códigos da máquina Enigma).

Em 21 de maio de 1941, os fallschirmjäger, apesar das baixas, pressionavam os neozelandeses que foram obrigados a recuar da área de Maleme. As tropas alemães desembarcadas na praia contribuindo para a tomar o aeródromo. Os Aliados continuavam a bombardear a área, enquanto que a 5ª Divisão de Montanha foi desembarcada.

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A Força C da Marinha Real britânica composta de três cruzadores leves e quatro contra-torpedeiros atuava na águas no entorno da ilha, praticamente impedindo o desembarque de reforços alemães. AS Forças A1, B e D da Royal Navy composta de cruzadores e contra-torpedeiros atuaram em conjunto com a Força C a fim de reforçar o bloqueio naval à ilha. A Luftwaffe detinha a superioridade aérea e bombardeava constantemente as forças navais britânicas. A 5ª Flotilha de Contra-torpedeiros (composta por 5 de navios). Após a perda de dois cruzadores e um contra-torpedeiro, os britânicos se retiram para Alexandria ou realizaram apenas operações noturnas. A Luftwaffe perdeu cinco Junkers Ju 87 Stuka e cinco Ju 88, além de danificarem mais dezesseis aeronaves, alguns dos quais caíram após seu retorno à base na noite de 21/22 de maio

Em 22 de maio, os neozelandeses fizeram um contra-ataque ao aeródromo de Maleme, mas fallschirmjäger já tinha organizado posições defensivas e contavam com o apoio aéreo de bombardeiros de mergulho Stuka. O contra-ataque os fracassou e os atacantes sofreram pesadas baixas.

Os fallschirmjäger estavam combatendo a 72 horas com armamentos leves e em inferioridade numérica, havia necessidade de se enviar reforços e armamento pesado. A saída da força naval britânica permitiu que os alemães desembarcasse pequenas quantidades de suprimentos, munição, metralhadoras pesadas, obuses e blindados, além de um número limitado de reforços. Em 28 de maio, os italianos desembarcaram uma brigada de infantaria e 13 blindados leves.

As seguidas derrotas levaram ao comando britânico a ordenar que as tropas se dirigissem para o sul da ilha a fim de serem evacuadas, o que aconteceu a partir de 28 de maio de 1941. Cerca de 18.600 homens dos 32 mil soldados britânicos na ilha foram evacuados. Cerca de 12 mil soldados britânicos, dos Domínios e milhares de gregos ainda estavam em Creta quando a ilha ficou sob controle alemão em 1º de junho e se juntaram a guerrilha grega na ilha.

Na visão dos Aliados a conquista de Creta possibilitaria ações do Eixo em Chipre, Líbia e Egito, mas com a decisão de deflagar a Operação Barbaross (invasão da União Soviética) faltavam ao Eixo, recursos humanos e materiais para realizar operações ofensivas em outros teatros com forças consideráveis.

Na verdade, a conquista de Creta foi uma operação defensiva que tinha por objetivo proteger o flanco sul do Eixo. No entanto, a Operação Mercúrio teve um alto custo, pois as perdas da Luftwaffe e dos fallschirmjäger foram consideráveis, não permitindo que o Eixo explorasse as vantagens estratégicas do recuo das forças Aliados no Mediterrâneo. As perdas materiais, de pilotos e de mão de obra qualificada iriam influenciar as capacidades que os alemães estavam reunindo para a Operação Barbarossa.

Os aliados tiveram 3.579 mortos, 1.918 feridos e 12.254 combatentes capaturados. Os gregos tiveram mais de 500 mortos e mais de 5 mil capturados. A Royal Navy perdeu no total 12 navios de guerra e sete auxiliares. A RAF perdeu 32 aviões.

As perdas alemães foram de 1.343 mortos, mais de 1.600 feridos e 2.300 desaparecidos. A Luftwaffe perdeu 284 aviões.

Imagem de Destaque: https://www.businessinsider.com/allies-nazis-learn-opposite-lessons-in-first-big-paratrooper-invasion-2021-5

Fontes

https://www.businessinsider.com/allies-nazis-learn-opposite-lessons-in-first-big-paratrooper-invasion-2021-5

Fallschirmjägers – Os Paraquedistas Alemães!

https://en.wikipedia.org/wiki/Battle_of_Crete

https://www.thoughtco.com/world-war-ii-battle-of-crete-2361468

Professor de História formado pela UGF. Mestrado e Doutorado em História pela UFRJ. Autor de artigos sobre História Militar e Geopolítica.

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