Prof. Dr. Ricardo Pereira Cabral
Em que pese as atenções da mídia ocidental estarem voltadas para a guerra na Ucrânia, a situação está longe de estar calma no Oriente Médio, vou apontar alguns acontecimentos importantes ocorridos nas últimas semanas.
Síria
A aviação israelense tem feito seguidos ataques aéreos à alegadas instalações do Hezbollah e da Guarda Revolucionária Iraniana no território sírio, além de ataques ao aeroporto de Damasco e bases militares sírias. As forças russas instaladas na Síria começaram a atacar a aviação israelenses em seus voos na Síria com os sistemas anti-aéreos S-300, não há notícias de combates dos israelenses com os sírio e russos.
O país tem sofrido atentados terroristas (Alepo) e os combates contra grupos extremistas islâmicos recrudesceram. Damasco controla mais de 60% do país, mas os curdos, as Forças Democráticas sírias e o Estados Islâmico controlam áreas da Síria, lutam entre si e contra o governo.
A Turquia tem realizados ataques aéreos contra instalações militares no Curdistão sírio e foram publicadas notícias que Istambul prepara uma ofensiva terrestre. Essa iniciativa não é vista com bons olhos pelo russos.
A guerra na Ucrânia tem dividido as atenções e o apoio militar russo ao regime de Damasco, até o momento, sem comprometer a estabilidade do regime. No entanto, parece que os sírios não estão conseguindo realizar ofensivas a fim de retomar o controle de todo o território nacional
Na Faixa de Gaza e na Cisjordânia o conflito entre judeus e palestinos é intermitente, momentos de paz tensa, se revezam, com explosões de violência por parte dos palestinos contra as restrições israelenses, que por sua vez reagem aos ataques dos extremistas palestinos, em uma espiral de violência que ameaça sair do controle. O Hezbollah e o Hamas estão sempre pronto a explorar alguma deficiência na segurança israelense para realizar atentados.
Irã
A campanha israelense, com o apoio norte-americano, contra os programas nuclear e aeroespacial iraniano ganharam novas tensões. O Irã acusa Israel de assassinar cientistas ligados aos programas. As seguidas falhas nos testes de foguetes e equipamentos nucleares, que Teerã, são indícios da atuação de agentes israelenses infiltrados no Irã.
Correm rumores da preparação da Força Aérea das Forças de Defesa de Israel preparam um ataque as instalações do programa nuclear afim de incapacitar os iranianos de produzirem sua bomba nuclear e de terem os meios de lançamento. Teerã acusa os Estados Unidos de apoiarem as ações israelenses e ameaça fechar o Estreito de Ormuz e atacar diretamente Israel, que em caso de ataque contra seu território
Teerã acusou Israel do assassinato do coronel Hassan Sayyad Khodaei, membro sênior da Guarda Revolucionária e da Força Quds, acusado por Tel Aviv por ataques terroristas contra israelenses. Nas últimas semanas vários membros sêniores das forças de segurança do Irã tem sido assassinados no território iraniano. Em retaliação Teerã executou um “agente do Mossad” acusado de assassinar um cientista nuclear iraniano.
Aliás, as atividades da Guarda Revolucionária Iraniana apoiando forças jihadistas que professam ou são simpatizantes do xiismo ou do Irã, em vários países, têm contribuído para a instabilidade na região. A Arábia Saudita e as monarquias sunitas do Golfo Pérsico estão lutando nessa guerra nas sombras, apoiadas pelos serviços de inteligência e forças especiais norte-americanas.
A Turquia é uma peça chave no Oriente Médio. O governo autoritário de Recep Tayyip Endorgan dividiu politicamente o país, onde repetidas acusações de golpe, tem sido utilizadas pelo governo como justificativa para reprimir, de forma violenta, a oposição. A instabilidade política está sendo amplificada pela falta de dinamismo econômico, que tem levado Ancara a movimentos diversionários no exterior como o envolvimento no conflito sírio ou na intermediação das negociações entre a Ucrânia e a Rússia.
A União Europeia conta com a Turquia para conter os movimentos migratórios vindo da região para o Velho Continente. Os Estados Unidos contam com Ancara para expandir a Otan e cercar os russos. Os próprios turcos vem com desconfiança essa busca por protagonismo, e não apoiam o envolvimento do país nos conflitos no Cáucaso e na Síria. Russos e iranianos rejeitam a presença dos turcos na Síria e no Iraque.
A saída atabalhoada dos Estados Unidos do Afeganistão e a tomada de poder pelo Talibã, não pacificou o país. Grupo ainda mais radicais que o Talibã, como o Estado islâmico do Khorasan, estão realizando atentados terroristas e atacando aldeias nas área próximas as fronteiras. A China tem apoiado o governo de Cabul a fim de diminuir a turbulência jihadista entre os uigures.
No Iêmen a trégua do Ramadan entre o governo, apoiado pela Arábia Saudita, e os rebeldes Houtis (apoiados pelo Irã) prossegue. Os norte-americanos e forças do governo estão engajados na luta contra jihadistas do Estado Islâmico, numa guerra esquecida.
Na Etiópia a guerra civil se alastra pelo país aumentando a violência contra a população civil e provocando ondas de refugiados.
As várias filiais do Estado Islâmico e da Al-Qaeda tem se expandido no Norte da África, notadamente, no Mali e na Líbia, chamando a atenção das forças da Otan.
Desde o governo Donald Trump, os Estados Unidos tem diminuído sua atuação na área, abrindo espaço para os atores regionais como a Turquia, o Irã e a Arábia Saudita atuarem. Washington mantém um presença forte no Golfo Pérsico, operadores de forças especiais no Iêmen, Síria, Iraque e voltaram a implantar forças na Somália, mas no restante da região tem se limitado a ações com contingentes de forças especiais e a CIA. A OTAN, ao que parece, está se limitando ao Norte da África, com a França atuando ativamente, nas suas antigas colônias.
A Guerra na Ucrânia, está concentrando a atenção da OTAN, quase que totalmente, no seu próprio continente. Os teatros de operação do Norte, do Báltico e do Cáucaso, precisam de uma resposta de Bruxelas, que vê ameaçada a estabilidade regional. Anos de baixo orçamento e falta de atenção ao cenário estratégico estão cobrando o seu preço.
Imagem de Destaque: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-36823662
Fontes
https://www.correiobraziliense.com.br/mundo/2022/05/5009770-coronel-da-guarda-revolucionaria-do-ira-e-assassinado-a-tiros-em-teera.html
https://br.sputniknews.com/20210918/revelado-como-mossad-planejou-e-executou-assassinato-do-cientista-nuclear-fakhrizadeh-18034155.html
https://oglobo.globo.com/mundo/mais-de-100-mortos-em-atentados-na-siria-19358178
https://www.em.com.br/app/noticia/internacional/2022/03/06/interna_internacional,1350510/morrem-15-soldados-em-ataque-terrorista-contra-onibus-militar-na-siria.shtml
https://www.em.com.br/app/noticia/internacional/2022/06/11/interna_internacional,1372756/bombardeio-israelense-inutilizou-pista-do-aeroporto-da-capital-siria.shtml
https://www.dn.pt/internacional/irao-avisa-israel-que-morte-de-dois-guardas-revolucionarios-nao-ficara-impune-14664384.html
https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2022/03/e-a-siria-hein-e-o-iemen-como-estao-outros-conflitos-em-meio-a-guerra-na-ucrania.shtml
https://www.bbc.com/portuguese/internacional-36823662
https://www.correiobraziliense.com.br/mundo/2022/03/4995909-guerra-na-ucrania-o-dilema-da-turquia-integrante-da-otan-e-amiga-de-putin.html
Irã rejeita presença militar da Turquia na Síria e no Iraque
https://www.aljazeera.com/news/2022/6/16/isil-leader-detained-in-syria-us-led-coalition
Professor de História formado pela UGF. Mestrado e Doutorado em História pela UFRJ. Autor de artigos sobre História Militar e Geopolítica.