Ucrânia: Aguardando a Ofensiva Russa de Verão

de

Por Alexandros Boufesis*

Em meio a negociações diplomáticas intensas e a um crescente esforço para cumprir as promessas de campanha do presidente Trump, a Rússia parece determinada a fazer a Ucrâniasofrer. Mesmo antes do início dos esforços diplomáticos, que inicialmente visavam um cessar-fogo e o fim da guerra, as exigências russas eram claras. A Rússia considera os territórios de Novorossiya, nomeadamente Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhia, que anexou em setembrode 2022, juntamente com a Crimeia, como territórios da Federação Russa. Apesar da disposiçãodo governo Trump em concordar com a cessão desses territórios, o presidente Zelensky é inflexível quanto à cessão da soberania nacional da Ucrânia, ou seja, ele nem sequer discute o assunto. Dada a intransigência da Rússia e a visão de que Zelensky carece de legitimidade pornão ter prosseguido com a realização de eleições ao final de seu mandato, a Rússia parece estarem meio a preparativos intensos para realizar uma série de ações agressivas com o objetivo final de ocupar mais territórios ucranianos. Afinal, a Rússia deixou bem claro que, se o presidenteZelensky não quiser a cessão dos quatro “Oblasts” (regiões), coisas piores virão, a saber, a perdade mais territórios ucranianos.

Na terça-feira, 27/05, segundo a Reuters, citando o governador da região de Sumy, Oleg Khryhorov, o exército russo ocupou as aldeias de Novenke, Bashivka, Veselivka e Zuravka, enquanto o Ministério da Defesa russo afirma que os russos também ocuparam a aldeia de Bilovodi. É claro e consistente com as últimas declarações russas de que os russos querem criaruma zona de segurança dentro da Ucrânia, a fim de preservar a integridade dos territórios russosno futuro e evitar a repetição do cenário de Kursk. É claro que a captura de Kursk pelosucranianos no ano passado foi, em grande parte, “com a bênção” da Rússia, que aplicou a máxima de Napoleão: “Quando seu inimigo estiver pronto para cometer um erro, não o interrompa”. É claro que a captura de Kursk pelos ucranianos e sua reconquista pelos russos nãorepresentam de forma alguma um confronto no contexto da guerra moderna. Pelo contrário, a guerra entre ucranianos e russos tem sido, até agora, o “Benny Hill Show” dos conflitosmodernos. Por onde começar? Com ​​o fato de que os russos, em 2022, se retiraram às pressas de áreas estrategicamente importantes para se concentrarem na suposta captura de Donetsk e Lugansk? Com ​​o fato de a força aérea ucraniana ainda estar em operação? Com ​​a perda da cidade de Kherson em novembro de 2022, por estar dentro do alcance do HIMARS? Com ​​um contra-ataque ucraniano do tipo “Kursk 1943” contra posições russas fortificadas e extensoscampos minados? Com ​​o cerco de Chasov Yar, há mais de um ano, com os russos atacando emondas, como na Primeira Guerra Mundial? Se dezenas de milhares de vidas não tivessem sidoperdidas de ambos os lados, seria engraçado. Mas não é!

É claro que a maior piada na Grécia é a publicação de textos como a “designação do novo Zhukov”, com páginas que se referem ao novo comandante das forças terrestres, Andrei Mordvichev, supostamente o “mentor” da captura de Mariupol. O que finalmente precisa ficarclaro é que a Rússia não precisa de heróis do tipo “Vingadores” para atingir seus objetivos. Ela precisa de conformidade na guerra moderna e, até agora, o que continuamos a ver é muito”show” e muitos desfiles com VIPs convidados a Moscou pelos BRICS, como o chinês Xi Jinping e o brasileiro Lula. Visionários da guerra moderna, como Valery Gerasimov, encontram-se com muita vontade, mas pouco apoio em termos de material vivo, desde os mais altos escalõesde oficiais até os comandantes de unidades. O uso de drones em grande número é, sem dúvida, um grande salto e um enorme avanço para a rígida filosofia militar russa, que historicamentetende a inicialmente resistir à integração de novas filosofias e tecnologias militares, mas não é suficiente por si só.

E neste ponto chegamos à grande questão: O que exatamente a Rússia quer alcançar com umagrande ofensiva de verão? a) Uma nova Blitzkrieg com forças se mobilizando de Sumy a Kherson? b) Outra Maskirovka ou conjunto de estratégias, para que os ucranianos corram para defender as fronteiras do nordeste, enquanto os russos finalmente esclarecem a situação nosterritórios de Novorossiya? c) conduzir ataques como parte de operações psicológicas, a fim de convencer o Ocidente de uma vitória russa inevitável e parar de armar a Ucrânia (este cenárioespecífico foi publicado em um relatório do Instituto para o Estudo da Guerra, ISW);

Nossa avaliação é que a Rússia está implementando uma “Mix Grill” de todos os cenários acima. Dentro da estrutura da doutrina “Vingadores”, como mencionado acima, soldados russos, equipados com motos de motocross, cruzam o campo de batalha em alta velocidade para evitarbaixas em massa causadas por drones ucranianos. Eles lembram os alpinistas que tentaramocupar a Finlândia antes do início da invasão alemã, mas também uma versão russa de Nicolas Cage no filme “Motoqueiro Fantasma”. Em outras palavras, o conceito russo de lidar com aameaça dos drones reside na escolha de correr e não no uso de unidades antiaéreas orgânicas, que, vale ressaltar, já existem para oferecer proteção pelo menos parcial. O problema com a filosofia russa desde a Guerra Fria é a redução a grandes unidades e não a pequenas. Ou seja, osrussos pensam no nível de Divisão/Brigada e não no nível de Pelotão/Companhia. Assim, embora existam, como dissemos, os meios para criar Proteção Antiaérea no nível das unidadesque operam na frente de batalha, estes são reduzidos ao nível do sistema geral de defesa aérea. O experimento implementado com os Grupos Táticos de Batalhão (BTGs), pelo menos em teoria, apresenta uma unidade orgânica autossuficiente, que é inclusive equipada com unidades de guerra eletrônica, como mostrado no diagrama. Até que ponto, no entanto, a orquestração e a cooperação, tanto dentro dos BTGs quanto entre eles, são alcançadas, permanece um mistério. A julgar pelos sucessos iniciais dos ucranianos, que operaram em pequenas unidades e nas”costuras” entre os BTGs, é muito provável que essa interação entre as unidades ainda sejainexistente. Assim como inexistente é a Pesquisa e Desenvolvimento Russa, que já poderia terproposto soluções, já que há três anos os ucranianos vêm abatendo russos com drones, soluçõescomparáveis ​​às propostas aos exércitos ocidentais (claro que não como uma panaceia, mas comoum meio de fornecer proteção, pelo menos na primeira fase).

Dada a rigidez da mentalidade e da filosofia militares, os russos estão tentando — talvez ao final deste confronto militar de vários anos, antes que a diplomacia assuma o controle — implementaruma variedade de objetivos estratégicos. Os erros que levaram à decepção de 2022, ou seja, o avanço simultâneo de todas as direções, parecem prontos para serem repetidos pelos russos, que já combinam uma retórica agressiva sobre a perda de território ucraniano adicional com a criaçãode uma zona-tampão no Nordeste, enquanto continuam os esforços para ocupar completamenteas regiões de Luhansk, Donetsk, Kherson e Zaporizhia. O cansaço da guerra em ambos os ladosé um dado adquirido, o que significa que mesmo a Rússia, que criou a narrativa da possibilidadede conduzir operações indefinidamente, na realidade precisa de pelo menos um cessar-fogo tanto quanto a Ucrânia. A condução de um conjunto final(?) de operações ofensivas com duração de alguns meses baseia-se no melhor cenário possível, ou seja, a cessação da ajuda ocidental à Ucrânia e os frutos de todo o seu pessoal em condições de combate que conseguiu mobilizar. No entanto, é extremamente duvidoso, mesmo no caso ideal de que as condições acima se apliquem, que eles alcancem simultaneamente a criação de uma zona de segurança e a ocupação dos territórios restantes das quatro províncias. Mesmo que a Rússia optasse pela mobilização geral, ainda seria duvidoso que pudesse executar planos tão grandiosos.

Talvez o cenário mais ideal neste caso seria se a Rússia optasse pelos frutos da diplomacia, mesmo que alcançasse a solução de manter pelo menos os territórios conquistados. Nesse caso, uma linha de escaramuça seria criada nas fronteiras das quatro regiões, mas também na fronteiraentre a Rússia e a Ucrânia. Ao mesmo tempo, os russos usariam o tempo até o próximo conflito(que, vale ressaltar, deve ser considerado um dado adquirido) para tornar conscientes as liçõesmilitares e prosseguir com o reabastecimento do potencial animado e inanimado, ao mesmotempo em que modificariam sua doutrina, incorporando (como já deveriam ter feito) novastecnologias militares. Infelizmente, porém, chegar a esse acordo específico causaria um efeitodominó de desdobramentos no edifício russo “Putin-Central”, pois seria considerado uma derrotaclara. A introversão que se seguiria desencadearia desdobramentos políticos e aceleraria umasucessão inevitável de Vladimir Putin com a ascensão de elementos radicais (cujo porta-voz é Dmitry Medvedev) do círculo íntimo do presidente. A ascensão de um representante da elite radical implicaria uma “promessa” de apagar a derrota da guerra ucraniana, que desonrou a “Rodina” (Mãe Pátria, em russo) e, da mesma forma que a Segunda Guerra Chechena começou, a Segunda Guerra Ucraniana começaria, mas desta vez sem ninguém garantindo a segurança da Europa e do Ocidente coletivo.

*Alexandros Boufesis possui mestrado em Estudos de Segurança Internacional (Universidade Metropolitana de Londres) e PgC em Contraterrorismo (Universidade de St. Andrews). Foi colaborador das revistas Strategiki e Epikaira, e atualmente colaboratambém das revistas Stratiotiki Istoria e Army History, bem como do website Obscure Histories. É autor dos livros “The Gods of War” e “Archon”, publicados pela LivanisPublications, bem como da monografia militar “The Russia-Georgia War of 2008: Russia’s Geostrategic Ascension”.

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