O caminho estreito para um ‘novo’ Oriente MédioUma Ordem Regional para Conter o Irã de Vez
O regime iraniano enfrenta sua crise mais profunda em décadas. A combinação de pressões internas, revezes militares regionais e o colapso de sua rede de aliados colocou Teerã em uma posição de vulnerabilidade sem precedentes desde a Revolução Islâmica de 1979. Enquanto Israel conseguiu golpes estratégicos significativos contra o eixo de resistência iraniano, a administração Trump parece incapaz de capitalizar esse momento histórico, insistindo em uma estratégia unilateral que privilegia a força militar sobre a construção de uma nova ordem regional.
A guerra em Gaza revelou tanto a força quanto os limites do poder iraniano. Por um lado, o ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023 demonstrou a capacidade de Teerã de orquestrar operações através de seus proxies. Por outro, a resposta israelense – que incluiu ataques diretos a alvos iranianos na Síria e ações para degradar a infraestrutura militar do Hezbollah no Líbano – mostrou que o “anel de fogo” ao redor de Israel pode ser rompido. Os números são eloquentes: o Hamas perdeu 17.000 combatentes e viu 22 de seus 24 batalhões serem desmantelados; o Hezbollah teve 70% de seus mísseis de longo alcance destruídos; e a queda de Bashar al-Assad na Síria privou o Irã de sua principal plataforma logística na região.
Esses desenvolvimentos criaram uma conjuntura única. Pela primeira vez em anos, surgiram governos no Líbano e na Síria que expressam abertamente o desejo de se libertar da tutela iraniana. No Líbano, o presidente Joseph Aoun – ex-comandante do Exército – desafia abertamente o Hezbollah, exigindo o desarmamento de todas as milícias. Na Síria, o novo líder Ahmed al-Shara move-se contra as redes de contrabando de armas e drogas ligadas a Teerã. Esses são desenvolvimentos promissores, mas frágeis: sem apoio internacional, esses governos podem sucumbir à pressão iraniana ou à própria inépcia.
É aqui que a estratégia americana mostra suas graves limitações. A administração Trump, em vez de construir sobre os ganhos israelenses, insiste em repetir a fórmula da “pressão máxima” – sanções econômicas e ações militares pontuais sem uma estratégia clara para o dia seguinte. Enquanto europeus e estados árabes iniciam diálogos com o novo governo sírio, os EUA permanecem à margem. Programas cruciais de assistência para estabilização pós-conflito no Líbano, Síria e Iraque foram congelados. A ajuda militar à Jordânia foi reduzida. E em Gaza, a ausência de uma visão clara para o período pós-Hamas permite que o grupo se reorganize nas sombras, explorando o vácuo de poder e o desespero da população.
Essa miopia estratégica é particularmente preocupante porque o Irã, embora enfraquecido, está longe de ser um adversário derrotado. Teerã já demonstrou sua capacidade de se adaptar a contratempos. Na Síria, há indícios de que agentes iranianos estão fomentando tensões sectárias para desestabilizar o novo governo. No Iêmen, os Houthis – agora a principal aposta regional do Irã – continuam a receber armamentos e treinamento, mantendo sua capacidade de perturbar o tráfego marítimo no Mar Vermelho. E no Iraque, milícias aliadas ao Irã estão se infiltrando nas instituições estatais, garantindo sua influência mesmo sem controle total do governo.
A janela de oportunidade está se fechando. Para consolidar os ganhos militares e evitar que o Irã recupere terreno, os EUA precisam urgentemente de uma estratégia mais sofisticada que combine pressão com diplomacia. Isso inclui:
- Apoio condicionado aos novos governos na Síria e Líbano, oferecendo alívio de sanções em troca de reformas e ruptura com as redes iranianas.
- Reengajamento diplomático multilateral, trabalhando com europeus e árabes para isolar o Irã enquanto se oferece um caminho para a normalização caso Teerã modere suas ambições regionais.
- Investimento maciço em estabilização pós-conflito, revitalizando programas de assistência que foram desmantelados nos últimos anos.
- Uma visão clara para Gaza, impedindo que o vácuo político seja preenchido pelo Hamas ou por outras forças extremistas.
O momento atual lembra, em muitos aspectos, os anos após a Segunda Guerra Mundial, quando os EUA assumiram a liderança na construção de uma nova ordem internacional. A diferença é que, desta vez, Washington parece relutante em exercer esse papel. Se essa oportunidade for perdida, pode levar décadas até que outra igual se apresente – e o preço da inação pode ser um Oriente Médio ainda mais instável e violento.
A lição dos últimos meses é clara: vitórias militares, por mais impressionantes que sejam, não se sustentam sem uma estratégia política que as consolide. Israel fez sua parte ao degradar a máquina de guerra iraniana. Agora, cabe aos EUA liderar o esforço para construir uma paz duradoura. O relógio está correndo.
Adaptado do conteúdo original: https://www.foreignaffairs.com/middle-east/narrow-path-new-middle-east